NOVENA DE NATAL - SANTO AFONSO MARIA DE LIGÓRIO

Na adoração do Menino Deus que acaba de
nascer, unem-se o Céu e a Terra: cantos
extasiados dos anjos, silêncio dos pastores,
êxtase terno e humilde de Maria e de José.
Explicação
Nesta santa noite de Natal, a Igreja celebra o
nascimento humano de Jesus, Filho de Deus,
Salvador do mundo, em Belém. Gerado
desde toda a eternidade pelo Pai, o Verbo
assumiu a nossa natureza humana no seio
da Virgem Maria, que lhe transmitiu,
realmente, a sua carne. Nasce num presépio.
Ele, que vem partilhar da nossa vida
humana, é Filho de Deus antes de o ser de
Maria e agora fica a ser, rigorosamente, uma
e outra coisa. A missa da noite sublinha este
duplo aspecto de grandeza divina e humilde
humanidade que constitui a própria essência
do mistério natalício.
* * *
1º Dia - 16 de dezembro
Deus nos deu seu Filho Unigênito por Salvador
Eu te constitui em luz para os gentios,
para que minha salvação chegue até os confins da terra. (Is. 49, 6)
Consideremos como o Pai eterno disse ao Menino Jesus no instante de sua concepção
estas palavras: Filho, eu te dei ao mundo como luz e vida das gentes, para que busques
sua salvação, que estimo tanto como se fosse a minha. É necessário, pois, que te
empenhes completamente em benefício dos homens. "Dado completamente aos homens,
e inteiramente entregue a suas necessidades". É necessário que ao nascer padeças
extrema pobreza, para que o homem se enriqueça; é necessário que sejas vendido como
escravo, para que o homem seja livre; é necessário que, como escravo, sejas açoitado e
crucificado, para pagar à minha justiça a pena devida pelos homens; é necessário que
sacrifiques sangue e vida, para livrar o homem da morte eterna. Fica sabendo, enfim, que
já não és teu, mas do homem. Pois um filho lhes nasceu, e um menino lhes foi dado.
Assim amado Filho meu, o homem voltará a amar-me a ser meu, vendo que te dou
inteiramente a ele, meu Filho Unigênito, e que já não me resta mais o que lhe possa dar.
Assim amou Deus - oh, amor infinito, digno somente de um Deus infinito - assim amou
Deus o mundo de tal forma, que lhe entregou seu Filho Unigênito. O Menino Jesus não se
entristeceu com esta proposta, mas, ao contrário, comprazeu-se nela e a aceitou com
amor e alegria: "como um esposo procedente de seu tálamo, exultou como gigante a
percorrer seu caminho" (Ps. 18,6). E desde o primeiro momento de sua encarnação se
entregou por completo ao homem e abraçou com gosto todas as dores e ignomínias que
havia de sofrer na terra por amor dos homens. Esses foram, segundo São Bernardo, as
colinas e vales que com tanta pressa devia atravessar Jesus Cristo, segundo o Cântico
dos Cânticos, para salvar os homens. Ei-lo que vem saltando pelas montanhas, brincando
pelas colinas.
Reflitamos aqui como o Pai, enviando-nos seu Filho para ser nosso Redentor e para selar
a paz entre Ele e os homens, obrigou-se de certo modo a perdoar-nos e a amar-nos, em
razão do pacto que fez de receber-nos em sua graça, posto que o Filho satisfaz por nós a
justiça divina. Por sua vez, o Verbo divino, tendo aceito a missão que lhe foi dada pelo
Pai, o qual, enviando-o para redimir-nos no-lo deu, obrigou-se também a amar-nos, não
por nossos méritos, mas para cumprir a piedosa vontade de seu Pai.
† Reza-se o Terço ...
Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Amado Jesus, se é verdade, como diz a lei, que o domínio se adquire com a doação, Vós
sois nosso, por vos ter vosso Pai entregue a nós. Por isso podemos com razão exclamar:
Deus meu e meu tudo. E já que sois nosso, nossas são vossas coisas, como nos afirma o
Apóstolo: "Como não nos dará, juntamente com seu Filho todas as coisas ?" Nosso é
vosso sangue, nossos vossos méritos, nossa a vossa graça, nosso vosso paraíso. E se
sois nosso, quem jamais poderá separar-nos de Vós? Ninguém poderá tirar-me Deus,
exclamava jubiloso Santo Antônio Abade. Assim queremos exclamar daqui em diante.
Apenas por nossas culpas podemos perder-vos e separar-nos de Vós, mas, Jesus, se no
passado vos deixamos e perdemos, agora nos arrependemos com toda a alma e nos
resolvemos a perder tudo, mesmo a vida, antes que vos perder, bem infinito e único amor
de nossas almas.
Damo-vos graças, Padre eterno, por nos terdes dado vosso Filho, e em troca de o terdes
dado por completo a nós, entregamo-nos inteiramente a Vós. Por amor desse mesmo
Filho, aceitai-nos e apertai-nos com laços de amor a nosso Redentor, de modo que
possamos exclamar: "Quem nos apartará do amor de Cristo ?".
Salvador nosso, já que sois todo nosso, tomai-nos todos para Vós; disponde de nós e de
nossas coisas como vos agrade. Como poderemos negar alguma coisa ao Deus que não
nos negou nada, nem seu sangue nem sua vida ?
Maria, nossa Mãe, guardai-nos com vossa proteção. Não queremos pertencer-nos mais,
mas inteiramente a Nosso Senhor. Lembrai-vos de fazer-nos fiéis. Em vós confiamos.
Cântico: Adeste, Fideles
2º Dia - 17 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Aflição do coração de Jesus no seio de Maria
Hóstias e oblações não quisestes, mas formastes-me um corpo. (Hebr. 10,5)
Considera a grande amargura com que devia sentir-se afligido e oprimido o coração do
Menino Jesus no seio de Maria, naquele primeiro instante em que o Pai lhe propôs a série
de desprezos, trabalhos e agonias que havia de sofrer em sua vida para libertar os
homens de suas misérias: "Pela manhã chama a meus ouvidos..., não retrocedi...,
entreguei meu corpo aos que me feriam" (Is. 50, 4-6). Assim falou Jesus pela boca do
Profeta: "Pela manhã...", quer dizer, desde o primeiro instante de minha concepção, meu
Pai me fez compreender sua vontade: que eu tivesse uma vida de sofrimento e fosse,
finalmente, sacrificado na cruz; "não retrocedi; entreguei meu corpo aos que me feriam". E
tudo aceitei pela salvação das almas e, desde então, entreguei meu corpo aos açoites,
aos cravos, e à morte.
Pondera então quanto padeceu Jesus Cristo em sua vida e em sua paixão; tudo lhe foi
posto ante os olhos desde o seio de sua Mãe e tudo Ele abraçou com amor; mas, ao
consentir nessa aceitação e vencer a natural repugnância dos sentidos, quanta angústia e
opressão não teve que sofrer o inocente Coração de Jesus! Conhecia bem o que
primeiramente tinha que padecer; os sofrimentos e opróbrios do nascimento numa fria
gruta, estábulo de animais; os trinta anos de trabalho como artesão; o considerar que
seria tratado pelos homens como ignorante, escravo, sedutor e réu da morte mais infame
e dolorosa que se reservava aos criminosos.
Tudo aceitou nosso amável Redentor a cada momento, e a cada momento em que o
aceitava, padecia reunidas todas as penas a abatimentos que depois padeceria até sua
morte. O próprio conhecimento de sua dignidade divina contribuía para que sentisse mais
as injúrias recebidas dos homens: "Tenho sempre presente a minha ignomínia".
Continuamente teve diante dos olhos sua vergonha, especialmente a confusão que
sentiria ao ver-se um dia despido, açoitado, pregado com três cravos de ferro, entregando
assim sua vida entre vitupérios e maldições daqueles que se beneficiavam com sua
morte. "Feito obediente até a morte e morte de cruz" (Phil. 2,8) e para quê ? Para salvarnos,
a nós, míseros e ingratos pecadores.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Amado Redentor nosso, quanto vos custou desde que entrastes no mundo, tirar-nos do
abismo em que nosso pecados nos haviam submergido. Para livrar-nos da escravidão do
demônio, ao qual nós mesmos nos vendemos voluntariamente, aceitastes ser tratado
como o pior dos escravos; e, nós que o sabíamos, tantas vezes tivemos a ousadia de
amargurar vosso amabilíssimo Coração, que tanto nos amou. Mas já que Vós, nosso
Deus, sendo inocente, aceitastes vida e morte tão penosas, aceitamos por vosso amor,
Jesus, todas as dores que nos venham de vossas mãos. Aceitamo-las e abraçamo-las
porque procedem daquelas mãos transpassadas um dia para livrar-nos do inferno, que
tantas vezes merecemos. Vosso amor, nosso Redentor, ao oferecer-vos para sofrer tanto
por nós, obriga-nos a aceitar por Vós qualquer pena e desprezo. Dai-nos a aceitar por
Vós qualquer pena e desprezo. Dai-nos, Senhor, por vossos méritos, vosso santo amor,
que nos torna doces todas as dores e todas as ignomínias. Amamo-vos acima de todas
as coisas, amamo-vos com todo o coração, amamo-vos mais que a nós mesmos. Vós, em
vossa vida, nos destes tantas e tão grandes provas de afeto e nós, ingratos, que prova de
amor vos damos? Fazei, pois, ó nosso Deus, que durante os anos que nos restam de vida
vos demos alguma prova de amor. Não nos atreveríamos, no dia do juízo, a comparecer
diante de Vós tão pobres como somos agora e sem fazer nada por vosso amor; mas que
podemos fazer sem vossa graça? Apenas rogar-vos que nos socorrais, e ainda essa
nossa súplica é graça vossa. Oh, Jesus, socorrei-nos pelo mérito de vossas dores e do
sangue que derramastes por mim.
Maria Santíssima, recomendai-nos a Vosso Filho, já que por nosso amor o tivestes em
vosso seio. Lembrai-vos que somos daquelas almas por quem morreu vosso Filho.
Cântico: Adeste, Fideles
3º Dia - 18 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Jesus faz-se Menino para conquistar nossa confiança e nosso
amor
Um menino nos nasceu, um filho nos foi dado. (Is. 9,6)
Consideremos como depois de tantos séculos, depois de tantas orações e pedidos, veio,
nasceu e se deu todo a nós o Messias, que não foram dignos de ver os santos patriarcas
e profetas; o desejado pelos gentios, o desejado pelas colinas eternas, nosso Salvador:
"Um menino nos nasceu, um filho nos foi dado". O Filho de Deus se fez pequeno para
fazer-nos grandes: deu-se a nós para que nos déssemos a Ele; veio mostrar-nos seu
amor, para que lhe déssemos o nosso. Recebamo-lo, pois com afeto, amemo-lo e
recorramos a Ele em todas as nossas necessidade. As crianças, diz São Bernardo,
facilmente concedem o que se lhes pede. Jesus veio como criança, para mostrar-nos que
está disposto a dar-nos todos os seus bens. "No qual se acham todos os tesouros" (Col.
2,3). "O Pai...entregou tudo em suas mãos" (Jo. 3,35). Se queremos luz, Ele veio para nos
iluminar; se queremos força para resistir aos inimigos, Ele veio para nos fortalecer; se
queremos o perdão e a salvação, Ele veio precisamente para nos perdoar e nos salvar; se
queremos, em uma palavra, o supremo dom do amor divino, Ele veio para nos abrasar; e,
para isto, sobretudo, se fez menino e quis apresentar-se a nós pobre e humilde, para
parecer mais amável, para tirar-nos todo o temor e conquistar nosso afeto: "Assim devia
vir quem quis desterrar o temor e buscar a caridade", diz São Pedro Crisólogo.
Além disso, Jesus Cristo quis vir criança, para que o amássemos não só com amor
apreciativo, mas com amor terno. Todas as crianças sabem conquistar para si afetuoso
carinho daqueles que a rodeiam e, quem não amará com ternura seu Deus, vendo-o
criancinha, com frio, pobre, humilhado e abandonado, que chora sobre as palhas de um
presépio?
Vinde amar Deus feito menino e feito pobre, e que é tão amável que desceu do céu para
entregar-se por completo a nós.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Ó amável Jesus, tão desprezado por nós! Descestes do céu para resgatar-nos do inferno
e dar-vos por completo a nós, como pudemos tantas vezes, voltar-vos as costas, ó Deus!
Os homens são tão gratos às criaturas que se alguém lhes dá um presente, se lhes envia
um cumprimento, se lhes dá qualquer prova de afeto, não se esquecem e se sentem
forçados a corresponder. E, pelo contrário, são tão ingratos convosco, que sois seu Deus,
e tão amável que por seu amor não recusastes dar o sangue e a vida. Mas, ai de nós, nós
fomos ainda piores que os outros, porque fomos mais amados e mais ingratos. Ah! Se as
graças que nos destes, as tivesses dado a um herege, a um idólatra, talvez se tivessem
santificado, e nós vos ofendemos. Por favor, não vos lembreis, Senhor, das injúrias que
vos fizemos. Dissestes que, quando um pecador se arrepende, esquecei-vos de todos os
pecados cometidos: "Nenhum dos pecados que cometeu lhe será recordado" (Ez. 18, 22).
Se no passado não nos amamos, no futuro não queremos senão vos amar. Já que vos
destes completamente a nós, damo-vos em troca toda a nossa vontade; com ela vos
amamos e que vos amamos queremos repetir para sempre. Queremos viver repetindo-o e
repetindo-o morrer, para começarmos desde o instante que entramos na eternidade a
amar-vos com um amor contínuo que durará eternamente. Entretanto, Senhor, nosso
único bem e único amor, propomo-nos a antepor vossa vontade a todos os nossos
prazeres. Por nada queremos deixar de amar quem nos amou tanto; não queremos mais
desgostar a quem devemos amor infinito. Secundai, Jesus, nosso desejo com vossa
graça.
Rainha nossa, Maria, reconhecemos que todas as graças recebidas de Deus são devidas
à vossa intercessão; continuai a interceder por nós, alcançai-nos a perseverança, vós que
sois a Mãe de todas as graças.
Cântico: Adeste, Fideles
4º Dia - 19 de dezembro
Cântico: Puer Natus
A paixão de Jesus Cristo durou toda sua vida
Minha dor está sempre diante de mim. (Ps. 37,18)
Consideremos como naquele primeiro instante em que foi criada e unida a alma de Jesus
Cristo a seu corpo, no seio de Maria, o Padre Eterno mostrou a seu Filho sua vontade de
que morresse pela redenção do mundo; e naquele mesmo instante lhe mostrou todas as
penas que devia sofrer até a morte para redimir os homens. Mostrou-lhe então todos os
trabalho, desprezos e pobreza que devia padecer em sua vida, tanto em Belém como no
Egito e em Nazaré, e depois todas as dores e ignomínias da paixão: açoites, espinhos,
cravos e cruz; todos os tédios, tristezas, agonias e abandonos no meio dos quais havia de
terminar sua vida no Calvário.
Abrão, conduzindo seu filho à morte, não quis afligi-lo dizendo-lhe antecipadamente que
morreria, e isso no pouco tempo que era necessário para chegar ao monte. Mas o Eterno
Pai quis que seu Filho encarnado, destinado como vítima de nossos pecados à sua
justiça, padecesse imediatamente, pelo conhecimento delas, todas as penas a que depois
teria que sujeitar-se durante sua vida e em sua morte. Daí, a tristeza padecida por Jesus
no Horto, capaz de tirar-lhe a vida, como ele declarou: "Minha alma está triste até a
morte" (Mt. 26,38), padeceu-a também constantemente desde o primeiro momento em
que esteve no seio de sua Mãe. Assim, desde então sentiu vivamente e sofreu o peso
reunido de todas as dores e vitupérios que O esperavam.
A vida inteira e todos os anos de nosso Redentor foram cheios de penas e lágrimas: "Na
dor se consome minha vida, e em soluços meus anos" (Ps. 30,11). Seu divino Coração
não teve um momento livre de sofrimentos; quer vigiasse ou dormisse, quer trabalhasse
ou descansasse, rezasse ou falasse, sempre tinha diante dos olhos essa amarga
representação, que atormentava mais sua santíssima Alma do que atormentaram aos
santos mártires todas as suas penas. Eles padeceram, mas, ajudados pela graça divina,
padeceram com alegria e fervor. Jesus Cristo sofreu, mas sofreu sempre com o coração
cheio de tédio e tristeza, e tudo aceitou por nosso amor.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Ó doce, ó amável, ó amante Coração de Jesus, assim desde menino fostes amargurado e
agonizáveis no seio de Maria ? Tudo isto sofrestes, Jesus, para satisfazer pela pena e
agonia eterna que nos cabia padecer no inferno por nosso pecados. Vós pois, padecestes
sem nenhum alívio para salvar-nos, depois de nós termos nos atrevido a abandonar a
Deus e voltar-lhe as costas, para satisfazer nossos gostos miseráveis. Graças vos damos,
Coração amante e aflito de Nosso Senhor. Agradecemo-vos e nos compadecemos de
Vós ao considerar que padecestes tanto pelos homens e que estes não se compadecem
de Vós. Como são grandes o amor de Deus e a ingratidão dos homens. Ó Redentor
nosso, como são poucos os homens que pensam em vossas dores e em vosso amor. Ó
Deus, como são poucos os que vos amam. E desgraçados de nós que também vivemos
tantos anos sem lembrarmo-nos de Vós! Vós padecestes tanto para que vos amássemos
e não vos amamos. Perdoai-nos, Jesus, perdoai-nos que queremos nos emendar e
queremos vos amar. Pobres de nós, Senhor, se resistirmos à Vossa graça e por nossa
resistência nos condenarmos. Quantas misericórdias usastes conosco e especialmente
vossa voz que agora nos convida a amar-vos, seriam nossas maiores penas no inferno.
Amado Jesus, tende piedade de nós, não permitais que vivamos mais ingratos a vosso
amor; dai-nos luz e força para vencer tudo e para cumprir vossa vontade. Escutai-nos,
rogamo-vos, pelos méritos de vossa Paixão.
De Vós esperamos tudo e de vossa intercessão, ó Maria. Querida Mãe, socorrei-nos, Vós
que nos alcançastes todas as graças que recebemos de Deus; continuai a nos ajudar,
pois se não o fazeis seremos infiéis, como o fomos no passado. Vós sois toda a nossa
esperança e toda a razão de nossa confiança.
Cântico: Adeste, Fideles
5º Dia - 20 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Jesus Cristo se ofereceu desde o princípio por nossa salvação
Foi imolado, porque Ele mesmo quis. (Is. 53,7)
O Verbo divino, desde o primeiro instante em que se viu feito homem e criança no seio de
Maria, se ofereceu por si mesmo às penas e à morte para resgate do mundo. Sabia que
todos os sacrifícios dos cordeiros e dos touros oferecidos a Deus na Antigüidade não
tinham podido satisfazer pelas culpas dos homens, mas que era necessário que uma
pessoa divina satisfizesse por eles o preço de sua redenção. Pelo que disse, como afirma
o Apóstolo: "Não quiseste hóstia nem oblação, mas me formaste um corpo. Então eu
disse; Eis-me aqui presente" (Heb. 10,5). Meu Pai, disse Jesus Cristo, todas as vítimas
que vos foram oferecidas até agora não bastam nem bastarão para satisfazer vossa
justiça; destes-me um corpo passível para que com a efusão de meu sangue vos aplaque
e salve os homens: eis-me aqui presente, "ecce venio", tudo aceito e tudo submeto a
vossa vontade.
A parte inferior de sua vontade experimentava, naturalmente, repugnância e recusava-se
a viver e a morrer entre tantas dores e opróbrios, mas venceu a parte racional, que estava
completamente subordinada à vontade do Pai, e aceitou tudo, começando Jesus a
padecer desde aquele instante, todas as angústias e dores que sofreria nos anos de sua
vida, assim agiu nosso divino Redentor desde os primeiros instantes de sua entrada no
mundo.
E como nos portamos nós com Jesus Cristo, desde que, chegados ao uso da razão,
começamos a conhecer, com as luzes da fé, os sagrados mistérios da redenção? Que
pensamentos, que desígnios, que bens temos amado? Prazeres, passatempos, soberbas,
vinganças, sensualidade, eis os bens que aprisionaram os afetos de nosso coração. Mas,
se temos fé, mudemos de vida e de amores; amemos a um Deus que tanto padeceu por
nós. Lembremo-nos das penas que o Coração de Jesus padeceu por nós desde criança,
e assim não poderemos amar senão esse Coração, que tanto nos amou.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Senhor nosso, quereis saber como nos portamos convosco em nossa vida? Desde que
começamos a ter o uso da razão começamos a menosprezar vossa graça e vosso amor.
Mas melhor que nós o sabeis vós e, apesar disso, nos suportastes porque nos amais
muito. Fugíamos de Vós, e vós vos aproximastes chamando-nos. Aquele mesmo amor
que vos fez baixar do céu para buscar as ovelhas perdidas, fez com que nos
suportásseis. Jesus, agora nos buscais e nós vos buscamos. Percebemos que vossa
graça nos assiste; assite-nos com a dor de nossos pecados, que odiamos mais que todos
os outros males; assisti-nos com o desejo que temos de vos amar e de vos dar gosto. Sim
Senhor nosso, queremos amar-vos e tanto quanto possamos. Certo que tememos por
nossa fragilidade e debilidade contraídas por causa de nossos pecados, mas muito amor
é a confiança que vossa graça nos infunde, fazendo-nos esperar em vossos méritos e
dando-nos grande ânimo para exclamar: "Tudo posso naquele que me conforta" (Phil.
4,13). Se somos débeis, Vós nos dareis força contra nossos inimigos; se estamos
enfermos, esperamos que vosso sangue seja nossa medicina; se somos pecadores,
confiamos em que nos santificareis. Confessamos que no passado cooperamos com
nossa ruína porque deixamos de recorrer a Vós nos perigos. De hoje em diante, Deus e
esperança nossa, a Vós queremos recorrer e de Vós esperamos toda ajuda e todo o bem.
Amamos-vos sobre todas as coisas e nada queremos amar fora de vós. Ajudai-nos, por
piedade, pelo mérito de tantos sofrimentos que desde o princípio sofrestes por nós.
Eterno Pai, por amor de Jesus Cristo, aceitai que vos amemos. Se vos iramos, aplacaivos
ao ver as lágrimas do menino Jesus, que vos roga por nós: "Põe teus olhos na face
de teu ungido" (Ps. 83,10). Não merecemos graças, mas merece-as esse Filho inocente,
que vos oferece uma vida de penas para que sejais conosco misericordioso.
E Vós, Maria, Maria, Mãe Misericordiosa, não deixeis de interceder por nós; sabeis quanto
confiamos em Vós, e sabemos bem que não abandonais a quem recorre a Vós.
Cântico: Adeste, Fideles
6º Dia - 21 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Jesus no seio de Maria
Sou contado entre os que descem à cova,
tornei-me como um homem sem força. (Ps. 87,5)
Consideremos a vida penosa por que passou Jesus Cristo no seio de sua Mãe. Era livre,
porque se tinha feito voluntariamente prisioneiro de amor, mas o amor o privava do uso da
liberdade e o mantinha em cadeias tão apertadas que não podia mover-se. Ó grande
paciência do Salvador! Ao pensar nas penas de Nosso Senhor ainda no seio de sua Mãe.
Vejamos a que se reduz o Filho de Deus por amor dos homens: priva-se de sua liberdade
e se encadeia para livrar-nos das cadeias do inferno. Muito, pois, merece ser reconhecida
com gratidão e amor a graça de nosso libertador e fiador, que, não por obrigação, mas
por afeto, se ofereceu para pagar e pagou nossas dívidas e nossas penas, dando por elas
sua vida: "Não te esqueças do benefício que te fez o que ficou por teu fiador, porque ele
expôs a sua vida por ti"(Eccli. 29,20).
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
"Não te esqueças do benefício que te fez o que ficou por teu fiador".Sim, ó Jesus, com
razão nos adverte o Profeta de que não nos esqueçamos da imensa graça que nos
fizeste. Nós éramos devedores e réus, e, Vós inocente. Vós, nosso Deus, quisestes
satisfazer por nossos pecados com vossas penas e com vossa morte. E depois
esquecemos esta graça e vosso amor e nos atrevemos a voltar-vos as costas, como se
não fosseis nosso Senhor, o Senhor que nos amou tanto. Mas, se no passado o
esquecemos, não queremos, Redentor nosso, esquecer-vos no futuro. Vossas penas e
vossa morte serão nosso contínuo pensamento, e elas nos recordarão sempre o amor
que nos tivestes. Maldizemos os dias em que, esquecidos de quanto sofrestes por nós,
abusamos lamentavelmente da liberdade que nos destes para amar-vos e empregamos
em desprezar-vos. Essa liberdade que nos destes, hoje vo-la consagramos. Livrai-nos, ó
Jesus, da desgraça de ver-nos de novo separados de Vós e feitos escravos do demônio.
Prendei a vossos pés nossas almas a fim de que não nos separemos mais de vós. Padre
Eterno, pelo cativeiro que o Menino Jesus padeceu no seio de Maria, livrai-nos das
cadeias do demônio e do inferno.
E Vós, Mãe de Deus, socorrei-nos. Carregai-nos aprisionados e estreitados ao Filho de
Deus. Pois, já que Jesus é vosso prisioneiro, fará tudo o que mandardes. Dizei-lhe que
nos perdoe e que nos faça santo. Ajudai-nos, nossa Mãe, pela graça e honra que vos fez
Jesus Cristo de habitar nove meses em vosso seio.
Cântico: Adeste, Fideles
7º Dia - 22 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Dor que causou a Jesus Cristo a ingratidão dos homens
Veio para o que era seu e os seus não o receberam. (Jo. 1,11)
Em certo Natal andava São Francisco pela floresta e pelos caminhos gemendo e
suspirando, e, ao perguntarem-lhe a causa de sua tristeza, respondeu: "Como quereis
que não chore vendo que o amor não é amado? Vejo Deus inebriado de amor pelos
homens e os homens tão ingratos para com esse Deus". Se tanto afligia essa ingratidão
dos homens a São Francisco, consideremos quanto mais afligirão ao Coração de Jesus.
Tão logo foi concebido no seio de Maria viu a cruel correspondência que havia de receber
dos homens. Tinha vindo do céu para atear o fogo do amor divino, e esse desejo o tinha
feito descer à terra e sofrer um abismo de penas e ignomínias: "Vim trazer o fogo à terra e
que quero senão que se ateie?" (Lc. 12,49). E depois via o abismo de pecados que
cometeriam os homens apesar de terem sido testemunhas de tantas provas de seu amor.
Esse foi, disse São Bernardino de Sena, o que lhe fez padecer uma dor infinita. Ainda
entre nós, quando alguém se Vê tratado ingratamente por outro é uma dor insuportável,
pois a ingratidão freqüentemente aflige a alma mais que outra dor ao corpo. Que dor,
pois, ocasionaria a Jesus, que era nosso Deus, ver que, por nossa ingratidão, seus
benefícios e seu amor seriam pagos com desgostos e injúrias? "Deram-me males em
troca de bens e ódio em troca do amor que eu lhes tinha". (Ps. 108,5). E ainda hoje se
lamenta Jesus Cristo: "Fui um estrangeiro para meus irmãos" (Ps. 68,9), pois vê que não
é amado nem conhecido de muitos, como se não lhes tivesse feito bem nenhum nem
tivesse sofrido nada por seu amor.
Ó meu Deus, que caso fazemos, mesmo os cristãos, do amor de Jesus Cristo? Apareceu
um dia Ele ao Beato Henrique Suso como um peregrino que mendigava de porta em
porta, sendo sempre posto fora com injúrias. Quantos são semelhantes àqueles de quem
falou Jó: "Eles diziam a Deus: Retira-te de nós, e julgavam o Onipotente, como se não
pudesse fazer nada; sendo que ele cumulou de bens as suas casas"(Job,22,17). Nós,
ainda que no passado nos tenhamos unido a esses ingratos, queremos continuar com
nossa ingratidão no futuro? Não, porque não o merece aquele amável Menino que veio do
céu padecer e morrer por nós para que o amássemos.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Senhor Jesus, que descestes do céu para que nós vos amássemos, tomando uma vida
cheia de trabalho e a morte numa cruz, como pudemos tantas vezes dizer-vos: "Retiraivos
de nós", não vos queremos, ó nosso Deus, se não fôsseis bondade infinita nem
tivésseis dado a vida para perdoar-nos, não nos atreveríamos a pedir-vos perdão; mas
sabemos que Vós mesmo nos quereis dar a paz: "Convertei-vos a mim, diz o Senhor
Deus dos exércitos e eu me voltarei para Vós" (Zach. 1,3). Vós mesmo, Jesus, que sois o
ofendido, intercedeis por nós. Não queremos, pois, ofender-vos ainda uma vez,
desconfiados de vossa misericórdia. Arrependemo-nos com toda a alma de vos ter
desprezado, meu sumo Bem. Dignai-vos receber-nos em vossa graça pelo sangue
derramado por Vós. "Pai, não sou digno de ser chamado teu filho" (Lc.15,21). Não, nosso
Redentor e Pai, não somos dignos de ser vossos filhos, porque tantas vezes renunciamos
ao vosso amor; mas Vós nos tornais dignos com vossos merecimentos. Que só o
pensamento da paciência com que suportastes nossos pecados durante tantos anos e
das graças que nos concedestes, depois de todas as injúrias que vos fizemos, faça-nos
viver ardendo nas chamas de vosso amor. Vinde, pois, Senhor, que não vos
expulsaremos mais, vinde habitar nosso pobre coração. Amamo-vos e queremos amarvos
para sempre, e Vós abrasai-nos sempre mais, com a lembrança do amor que nos
tivestes.
Cântico: Adeste, Fideles
8º Dia - 23 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Amor de Deus aos homens no nascimento de Jesus
Porque apareceu a graça de Deus nosso Salvador a todos os homens, ensinandonos
que renunciando à impiedade... vivamos piedosamente no presente século,
aguardando a esperança bem-aventurada e a vinda gloriosa do grande Deus e
Salvador Nosso Senhor Jesus Cristo. (Tit. 2, 12-14)
Consideremos que a graça salvadora de Deus que se manifestou a todos os homens foi o
profundíssimo amor de Jesus Cristo aos homens. Esse amor, embora tenha sido da parte
de Deus sempre idêntico, nem sempre foi igualmente manifesto.
Antes fora prometido muitas profecias e encoberto sob o véu de muitas figuras. Mas, no
nascimento do Redentor, deixou-se ver claramente, aparecendo aos homens o Verbo
eterno como menino deitado sobre o feno, gemendo e tremendo de frio, começando já
assim a satisfazer pelas penas que merecíamos e dando-nos a conhecer o afeto que nos
tinha, sacrificando por nós a vida: "Nisto conhecemos a caridade de Deus, porque Ele deu
sua vida por nós". Manifestou-se, pois, a graça salvadora de Deus, e manifestou-se a
todos os homens. Mas porque não o conheceram todos e ainda hoje há tantos que,
podendo, não o conhecem? Porque "a luz veio ao mundo e os homens amaram mais as
trevas que a luz" (Jo. 3,19). Não o conheceram nem o conhecem porque não querem
conhecê-lo e amam mais as trevas do pecado do que a luz da graça. Não pertençamos
ao número desses infelizes. Se até aqui temos fechado os olhos à luz, pensando pouco
no amor de Jesus Cristo, procuremos, até o fim de nossa vida, ter sempre ante os olhos
os sofrimentos e a morte de nosso Redentor, para amar a quem tanto nos amou:
"Aguardando a bem-aventurada esperança e a vinda gloriosa do grande Deus e Salvador
Nosso Jesus Cristo" (Tit. 2,13).
Assim poderemos confiar fundadamente, segundo as divinas promessas, alcançar aquele
paraíso que Jesus Cristo nos conquistou com seu sangue. Nesta primeira manifestação
vem Jesus Cristo como menino, pobre e desprezado, nascido num estábulo, coberto de
pobres panos e reclinado na palha, mas na segunda aparição virá sobre um trono de
majestade: "E verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens do céu com grande poder e
majestade" (Mt. 24,30). Feliz naquela hora quem não o tenha odiado ou desprezado.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Óh, Santo Menino, agora vos contemplamos sobre a palha, pobre, aflito e abandonado;
mas sabemos que vireis um dia para julgar-nos sobre esplendoroso trono, rodeado de
anjos. Perdoai-nos antes de julgar-nos. Então sereis um juiz rigoroso, mas agora sois
nosso Redentor e nosso Pai misericordioso. Ingratos fomos, não vos conhecendo por não
querer conhecer-vos, e em vez de pensar em amar-vos, considerando o amor que nos
tivestes, só pensamos em satisfazer nosso apetite, desprezando vossa graça e vosso
amor. Em vossas mãos pomos nossa alma, que tantas vezes nos esforçamos por perder,
para que Vós as salveis. "Em tuas mãos entrego meu espírito: tu me livrarás. Senhor,
Deus de Verdade" (Ps. 30,6). Em Vós deposito minhas esperanças, pois seis que, para
resgatar-me do inferno, destes sangue e vida. Tu me livrarás, Senhor, Deus de Verdade.
Não me fizestes morrer quando eu estava em pecado e me esperastes com tanta
paciência para que, entrando em mim, me arrependesse de vos ter ofendido, começasse
a amar-vos e assim pudésseis perdoar-me e salvar-me. Sim, meu Jesus, quero agradarvos;
arrependo-me de todo o mal e desgosto que vos tenho causado. Salvai-me por vossa
misericórdia e seja minha salvação amar-vos sempre nesta vida e por toda a eternidade.
Minha amada Mãe, recomendai-me a vosso Filho, fazei-o ver que sou servo vosso e que
em Vós pus minha esperança, pois Ele vos ouve e não vos nega nada.
Cântico: Adeste, Fideles
9º Dia - 24 de dezembro
Cântico: Puer Natus
Viagem de São José e de Maria Santíssima a Belém
Subiu também José para inscrever-se no censo com Maria,
sua esposa, que estava prestes a dar à luz. (Lc.10,5)
Tinha Deus decretado que seu Filho nascesse nem sequer na casa de José, mas numa
gruta, num estábulo, do modo mais pobre e penoso que possa nascer uma criança; já
para isso dispôs que César Augusto publicasse um édito no qual ordenava que fossem
todos recensear-se em sua cidade natal. José, ao ter notícia dessa ordem, certamente
hesitou sobre deixar ou levar consigo Maria Santíssima, próxima de dar à luz, uma vez
que não tinha riqueza para proporcionar-lhe uma viagem conveniente, nem queria, por
outro lado, deixá-la sozinha e sem amparo.
Sabia, contudo, Maria que, como anunciara o profeta Miquéias, devia o Salvador nascer
em Belém; por isso, tomando os panos e roupas que preparara para seu Filho, partiu Ela
com José, pobremente, em tempo de inverno, prestes a dar à luz, para submeter-se à
vontade de Deus.
Una-nos a eles, e através das penas e dores da nossa viagem por esta vida, louvemos a
Deus, sejamos-lhe gratos, pedindo-lhe apenas que esteja sempre conosco Nosso Senhor
Jesus Cristo.
Peçamos a José e a Maria que pelo mérito das penas padecidas em sua viagem, nos
acompanhem na viagem que estamos fazendo para a eternidade.
† Reza-se o Terço e a Ladainha de Nossa Senhora
Oração
Meu amado Redentor, acompanhado na terra apenas por José e Maria, ao ir a Belém,
permiti-me que vos acompanhe também eu, Vós descestes do céu para ser meu
companheiro na terra, e eu tantas vezes já vos abandonei ofendendo-vos ingratamente.
Quando penso que, tantas vezes, para seguir minhas malditas inclinações, separei-me de
Vós, renunciando a vossa amizade, quisera morrer de dor. Vós viestes para perdoar-me;
assim, pois, perdoai-me imediatamente, pois com toda a alma me arrependo de vos ter
dado tantas vezes as costas e abandonado. Proponho e espero, com vossa graça, não
vos deixar mais nem separar-me mais de Vós. Uni-me, estreitai-me com os suaves laços
de vosso santo amor, meu Redentor e meu Deus.
Maria Santíssima, venho acompanhar-vos em vossa viagem; não deixeis de assistir-me
na que estou fazendo para a eternidade. Assisti-me sempre e, especialmente, quando me
achar no fim de minha vida, próximo ao instante de que depende estar sempre convosco
para amar a Jesus no paraíso, ou estar sempre longe de vós, para odiar a Jesus no
inferno. Minha Rainha, salvai-me por vossa intercessão, e seja a minha salvação amarvos,
a vós e a Jesus, para sempre, no tempo e na eternidade. Sois minha esperança; em
vós confio.
Cântico: Adeste, Fideles

A pureza dispõe o intelecto, como espelho limpo, a receber luz abundante de Deus.

‘ANTES DA ORAÇÃO PREPARA A TUA ALMA, E NÃO SEJAS COMO QUEM TENTA A DEUS’
(Eclesiástico 18, 23)


EMENTA - Se, quando te apresentas diante de uma pessoa de respeito, preparas bem o que deves dizer, por que não deverias agir assim, e com muito maior respeito ainda, quando te apresentas diante de Deus?
‘Não digas nada inconsideradamente, nem o teu coração se apresse a proferir palavras diante de Deus’ (Eclesiastes 5, 1).
A pureza dispõe o intelecto, como espelho terso [limpo], a receber luz abundante de Deus. A mortificação dispõe a vontade, como um vaso vazio para receber abundantemente aqueles gozos espirituais que Deus nega a quem não lhe sacrifica os prazeres dos sentidos.
Procura descobrir qual o defeito que mais te domina, qual é a dívida que mais te obriga, e dirige a oração em tal sentido. Como te enganarias não fazendo esse estudo contínuo sobre ti mesmo!
‘Não te envergonhes de conservar-te justo até a morte’ (Ecles. 18, 22).
Se não és daqueles poucos que têm sempre o coração aceso de amor atual para com o Senhor, deves apresentar ao teu coração alguma coisa para despertá-lo, para pôr-te em oração porque a oração não consiste no hábito, mas no ato.
É, pois, claro que antes de pôr-te em oração, deves ter idéias claras e bem estabelecidas acerca do sentido e do fim de tua oração.
*** *** ***



I - Há dois modos de tentar a Deus: um expresso, outro tácito.
O expresso seria se o homem deixasse de fazer o que deve de sua parte, para ver até onde chegará a piedade, a ciência, o poder de seu Senhor em socorrê-lo.
O tácito seria se o homem não tivesse por fim direto de sua negligência tentar a Deus, mas proceder de fato como se a tivesse. É muito raro que alguém deixe de se preparar para a oração com a intenção expressa de tentar a Deus, isto é, que o faça para ver (‘testar’) se Deus, mesmo assim, lhe comunica igualmente luzes internas. Por isso o nosso texto não diz diretamente: ‘e não tentes a Deus’; mas não é raro que haja quem deixa de preparar-se [para a oração], exigindo praticamente de Deus a mesma coisa, mesmo sem a querer diretamente. Por isso o nosso texto diz mais diretamente: ‘e não sejas como o homem que tenta a Deus’. Aqui, pois, se trata de um tentar tácito, implícito ou interpretativo.
Com efeito, o que fazes realmente quando chegas à presença divina, sem nenhuma preparação, senão confiar inteiramente na ventura [no acaso]? Deus quer que, mesmo na oração, não deixes de fazer tudo o que podem as tuas forças. Não te admires se na oração te encontres árido, distraído. A culpa é tua. Em vez de fazer como muitos, que se preparam convenientemente, tu não cuidas da preparação — ou por distração ou por não tê-la nunca aprendido. Todavia te persuades de que Deus estará presente e corresponderá à tua oração. Não é uma espécie de presunção?
Se, quando te apresentas diante de uma pessoa de respeito, preparas bem o que deves dizer, por que não deverias agir assim, e com muito maior respeito ainda, quando te apresentas diante de Deus?
‘Não digas nada inconsideradamente, nem o teu coração se apresse a proferir palavras diante de Deus’ (Eclesiastes 5, 1).

II- Há dois modos de preparação para a oração: um próximo, outro remoto.
A preparação remota é a vida pura e mortificada. A pureza dispõe o intelecto, como espelho terso [limpo], a receber luz abundante de Deus. A mortificação dispõe a vontade, como um vaso vazio para receber abundantemente aqueles gozos espirituais que Deus nega a quem não lhe sacrifica os prazeres dos sentidos.
A preparação próxima é retirar-se, recolher-se, é preestabelecer o que se quer pedir a Deus, como ensinam os Santos. É especialmente a esse respeito que adverte o Autor Sagrado: ‘Antes da oração, prepara a tua alma e não sejas como quem tenta a Deus’.
Não é, por ventura, tentar a Deus pôr-te em oração, como uma barca sem piloto, sem leme, sem equipamento, se faz ao mar, ao capricho e à mercê dos ventos? E se o vento não soprar? Tu pretendes que o vento sopre justamente na direção que desejas!
Queres obrigar a Deus a fazer um milagre! Procura descobrir qual o defeito que mais te domina, qual é a dívida que mais te obriga, e dirige a oração em tal sentido. Como te enganarias não fazendo esse estudo contínuo sobre ti mesmo!
‘Não te envergonhes de conservar-te justo até a morte’ (Ecles. 18, 22). E, imediatamente depois destas palavras, vêm as da meditação de hoje: ‘Antes da oração, prepara a tua alma’ — como que indicando que tanto deverás preparar-te para a oração quando poderá ainda durar a luta da tua justificação [salvação eterna].

III- Pode acontecer de pensar que estás sempre preparado para a oração, e então não tens necessidade do conselho que estamos meditando. Procura, então, que a tua disposição seja real, como a crês.
Há alguns que na oração estão duros e imóveis como pedras, sem fazer nada. Certamente que poderemos estar prontos continuamente para esse tipo de oração. Contudo, podes estar satisfeito com isso?
Na oração deves chegar a exercitar, como fizeram os Santos, todas as suas potências em honra de Deus. Se não és daqueles poucos que têm sempre o coração aceso de amor atual para com o Senhor, deves apresentar ao teu coração alguma coisa para despertá-lo, para pôr-te em oração porque a oração não consiste no hábito, mas no ato.
O texto que tu meditas é exigente. Quer que vás rezar evitando que sejas daqueles que parecem tentar a Deus. Portanto, exige que sejam usados todos os meios idôneos para evitart isso. E parece-te que em certa medida não queiras tentar a Deus, quando te apresentas diante dEle sem teres pensado nem mesmo uma mínima coisa de quanto deves tratar com Ele? Dirás que basta pdir-lhe alguma coisa em geral? Todavia, Jesus não te ensinou a fazer assim.
De fato, o cego de Jericó Lhe tinha gritado em termos gerais: ‘Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim’ (Mc 10, 47). Entretanto, Cristo convidou-o a descer ao particular, perguntando-lhe: ‘Que queres que eu te faça?’ (ib.). Assim nos ensinou a expor as nossas necessidades do modo mais preciso.
‘Mestre, que eu veja”’ (Ib.).

IV- É, pois, claro que antes de pôr-te em oração, deves ter idéias claras e bem estabelecidas acerca do sentido e do fim de tua oração. Isso não tira a liberdade de variar, no decurso da oração, as tuas petições, quando se apresentam a ocasião e a inspiração. O Autor sagrado quer só que ‘não sejas como quem tenta a Deus’.
Dois são os excessos em matéria de oração: não fixar-se nenhum fim, quando vais rezar; ou fixar-se algo com tanta rigidez que disso não te apartes, tolhendo-te toda liberdade. Devem evitar-se os dois extremos.
Pode também acontecer que, mesmo sem nenhuma preparação, a oração te saia bem. Contudo, certamente te sairia muito melhor se te preparasses para ela convenientemente. Os remédios podem às vezes fazer bem, mesmo quando tomados ao acaso. No entanto, afinal de contas, os que são deveras salutares são aqueles que são tomados com método: ‘A ciência do médico exaltará a sua cabeça’ (Ecli 38, 3).


(TEMAS BÍBLICOS PARA A MEDITAÇÃO DE TODOS OS DIAS – Padre Paulo SÉGNERI, SJ, Coleção ‘MANÁ DA ALMA’, Vol. XII, Dezembro; Edições Paulinas, São Paulo, 1964, p. 5-7 – Título original LA MANNA DELL’ANIMA, Vol. XII — Tradução do Prof. Euclides Carneiro da Silva e do Padre Lucas A. Caravina)

Maria Santíssima : Imune de toda mancha do pecado original

As palavras do Papa durante o Angelus pela Festa da Imaculada

CIDADE DO VATICANO, quinta-feira, 8 de dezembro de 2011(ZENIT.org) – Às 12 de hoje, Solenidade da Imaculada Conceição da Beata Virgem Maria, o Santo Padre Bento XVI se aproximou da janela de seu escritório no Palácio Apostólico Vaticano para rezar o Angelus com os fiéis e peregrinos na Praça de São Pedro.

Estas são as palavras do Papa na introdução da oração mariana:

Queridos irmãos e irmãs!

Hoje a Igreja celebra solenemente a Imaculada Conceição de Maria. Como declarou o Beato Pio IX, em sua Carta Apostólica Ineffabilis Deus de 1854, Ela "foi preservada, por singular graça e privilégio de Deus onipotente, em vista dos méritos de Jesus Cristo, o Salvador da humanidade, imune de toda mancha do pecado original." Esta verdade de fé está contida nas palavras de saudação do Arcanjo Gabriel: "Ave, cheia de graça: o Senhor é contigo" (Lc1, 28).

A expressão "cheia de graça" indica a obra maravilhosa de Deus, que quis nos devolver a ida e a liberdade, perdidas pelo pecado, por meio de Seu Filho Unigênito encarnado, morto e ressuscitado.

Portanto, desde o século II, no Oriente e Ocidente, a Igreja invoca e celebra a Virgem que, com seu "sim", aproximou o Céu da terra, tornando-se "geradora de Deus e nutriz de nossas vidas", como expressa São Romano na melodia de um antigo canto (Canticum Mariae Virginis XXVem Nativitatem B.,no JB Pitra, Analecta Sacra t. I, Paris 1876, 198).

No século VII São Sofrônio de Jerusalém elogia a grandeza de Maria, porque Nela o Espírito Santo fez morada, “Tu exerce toda a magnificência dos dons que Deus jamais ofereceu a qualquer pessoa humana. Mais que tudo, és rica da presença de Deus que mora em ti”. (Oratio II, 25 in SS. Deiparæ Annuntiationem: PG 87, 3, 3248 AB). E São Beda, o Venerável, explica: "Maria é bendita entre as mulheres, porque com a dignidade da virgindade encontrou a graça de ser geradora de um filho que é Deus" (Hom I, 3: CCL 122, 16).

Também a nós é dada a "plenitude de graça" que devemos fazer resplandecer em nossas vidas, porque "o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo - escreve São Paulo – que nos abençoou com toda bênção espiritual... e nos acolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis... predestinou para sermos adotados como filhos (Ef 1,3-5). "Esta filiação recebemos através da Igreja, no dia do Batismo. A este respeito, Santa Hildegard de Bingen escreve: "A Igreja é, portanto, a mãe virgem de todos os cristãos. Na força secreta do Espírito Santo os concebe e os dá a luz, oferecendo-os a Deus de maneira que sejam também chamados filhos de Deus” (Scivias, visio III, 12: CCL Continuatio Mediævalis XLIII, 1978, 142).

Entre muitos cantores da beleza espiritual da Mãe de Deus, está São Bernardo de Claraval, que afirma que a invocação "Ave Maria cheia de graça" é "agradável a Deus, aos anjos e aos homens. Aos homens, devido à maternidade, aos Anjos graças a virgindade, a Deus graças a humildade "(Sermo xlvii, De Annuntiatione Dominica: SBO VI, 1, Roma 1970, 266).

Queridos amigos, esperando cumprir nesta tarde, como é habitual, a homenagem a Maria Imaculada na Piazza di Spagna, dirijamos nossa oração fervorosa àquela que intercede a Deus por nós, para que nos ajude a celebrar com fé o Natal do Senhor que se aproxima.

(Tradução:MEM)

A Existência do Deus Criador em Tomás de Aquino


Apresentação e defesa da Monografia de Conclusão de Curso do Curso de Especialização em Filosofia “Questões Filosóficas Fundamentais e Ensino de Filosofia” pelo aluno Sávio Laet de Barros Campos

Para conhecer mais, acesse o site:

http://www.filosofante.org/filosofante/?mostra=noticia&ver=1&id=247&le=F13&label

Parabéns Sávio, pela escolha e defesa do tema. Que Deus abençõe

ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

CONSTITUIÇÃO APOSTÓLICA DO PAPA PIO XII

MUNIFICENTISSIMUS DEUS

DEFINIÇÃO DO DOGMA DA ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

EM CORPO E ALMA AO CÉU

Introdução

1. Deus munificentíssimo, que tudo pode, e cujos planos de providência são cheios de sabedoria e de amor, nos seus imperscrutáveis desígnios, entremeia na vida os povos e dos indivíduos as dores com as alegrias, para que por diversos caminhos e de várias maneiras tudo coopere para o bem dos que o amam (cf. Rm 8,28).

2. o nosso pontificado, assim como os tempos atuais, tem sido assediado por inúmeros cuidados, preocupações e angústias, devido às grandes calamidades e por muitos que andam afastados da verdade e da virtude. Mas é para nós de grande conforto ver como, à medida que a fé católica se manifesta publicamente cada vez mais ativa, aumenta também cada dia o amor e a devoção para com a Mãe de Deus, e quase por toda parte isso é estímulo e auspício de uma vida melhor e mais santa. E assim sucede que, por um lado, a santíssima Virgem desempenha amorosamente a sua missão de mãe para com os que foram remidos pelo sangue de Cristo, e por outro, as inteligências e os corações dos filhos são estimulados a uma mais profunda e diligente contemplação dos seus privilégios.

3. De fato, Deus, que desde toda a eternidade olhou para a virgem Maria com particular e pleníssima complacência, quando chegou a plenitude dos tempos (Gl 4,4) atuou o plano da sua providência de forma que refulgissem com perfeitíssima harmonia os privilégios e prerrogativas que lhe concedera com sua liberalidade. A Igreja sempre reconheceu esta grande liberalidade e a perfeita harmonia de graças, e durante o decurso dos séculos sempre procurou estudá-la melhor. Nestes nossos tempos refulgiu com luz mais clara o privilégio da assunção corpórea da Mãe de Deus.

4. Esse privilégio brilhou com novo fulgor quando o nosso predecessor de imortal memória, Pio IX, definiu solenemente o dogma da Imaculada Conceição. De fato esses dois dogmas estão estreitamente conexos entre si. Cristo com a própria morte venceu a morte e o pecado, e todo aquele que pelo batismo de novo é gerado, sobrenaturalmente, pela graça, vence também o pecado e a morte. Porém Deus, por lei ordinária, só concederá aos justos o pleno efeito desta vitória sobre a morte, quando chegar o fim dos tempos. Por esse motivo, os corpos dos justos corrompem-se depois da morte, e só no último dia se juntarão com a própria alma gloriosa.

5. Mas Deus quis excetuar dessa lei geral a bem-aventurada virgem Maria. Por um privilégio inteiramente singular ela venceu o pecado com a sua concepção imaculada; e por esse motivo não foi sujeita à lei de permanecer na corrupção do sepulcro, nem teve de esperar a redenção do corpo até ao fim dos tempos.

6. Quando se definiu solenemente que a virgem Maria, Mãe de Deus, foi imune desde a sua concepção de toda a mancha, logo os corações dos fiéis conceberam uma mais viva esperança de que em breve o supremo magistério da Igreja definiria também o dogma da assunção corpórea da virgem Maria ao céu.

Petições para a definição dogmática

7. De fato, sucedeu que não só os simples fiéis, mas até aqueles que, em certo modo, personificam as nações ou as províncias eclesiásticas, e mesmo não poucos Padres do concílio Vaticano pediram instantemente à Sé Apostólica esta definição.

8. Com o decurso do tempo essas petições e votos não diminuíram, antes foram aumentando de dia para dia em número e insistência. Com esse fim fizeram-se cruzadas de orações; muitos e exímios teólogos intensificaram com ardor os seus estudos sobre este ponto, quer em privado, quer nas universidades eclesiásticas ou nas outras escolas de disciplinas sagradas; celebraram-se em muitas partes congressos marianos nacionais e internacionais. Todos esses estudos e investigações mostraram com maior realce que no depósito da fé cristã, confiado à Igreja, tatmbém se encontrava a assunção da virgem Maria ao céu. E de ordinário a conseqüência foi enviarem súplicas em que se pedia instantemente a definição solene desta verdade.

9. Acompanhavam os fiéis nessa piedosa insistência os seus sagrados pastores, os quais dirigiram a esta cadeira de S. Pedro semelhantes petições em número muito considerável. Quando fomos elevado ao sumo pontificado, já tinham sido apresentadas a esta Sé Apostólica muitos milhares dessas súplicas, vindas de todas as partes do mundo e de todas as classes de pessoas: dos nossos amados filhos cardeais do Sacro Colégio, dos nossos veneráveis irmãos arcebispos e bispos, das dioceses e das paróquias.

10. Por esse motivo, ao mesmo tempo que dirigíamos a Deus intensas súplicas, para que concedesse à nossa mente a luz do Espírito Santo para decidirmos tão importante causa, estabelecemos normas especiais em que determinamos que se procedesse com todo o cuidado a um estudo mais rigoroso da matéria, e se reunissem e examinassem todas as petições relativas à assunção da santíssima virgem, enviadas à Sé Apostólica desde o tempo do nosso predecessor de feliz memória, Pio IX, até ao presente.(1)

Consulta ao episcopado

11. Mas como se tratava de assunto de tanta importância e transcendência, julgamos oportuno rogar direta e oficialmente a todos os nossos veneráveis irmãos no episcopado, que nos quisessem manifestar explicitamente a sua opinião. Para tal fim, no dia 1° de maio de 1946, dirigimos-lhes a carta encíclica "Deiparae Virginis Mariae" em que fazíamos esta pergunta: "Se vós, veneráveis irmãos, na vossa exímia sabedoria e prudência, julgais que a assunção corpórea da santíssima Virgem pode ser proposta e definida como dogma de fé, e se desejais que o seja, tanto vós como o vosso clero e fiéis".

Doutrina concorde do magistério da Igreja

12. E aqueles que "o Espírito Santo colocou como bispos para reger a Igreja de Deus" (At 20, 28) quase unanimemente deram resposta afirmativa a ambas as perguntas. Essa "singular concordância dos bispos e fiéis" (2) em julgar que a assunção corpórea ao céu da Mãe de Deus podia ser definida como dogma de fé, mostra-nos a doutrina concorde do magistério ordinário da Igreja, e a fé igualmente concorde do povo cristão - que aquele magistério sustenta e dirige - e por isso mesmo manifesta, de modo certo e imune de erro, que tal privilégio é verdade revelada por Deus e contida no depósito divino que Jesus Cristo confiou a sua esposa para o guardar fielmente e infalivelmente o declarar. (3) De fato, esse magistério da Igreja, não por estudo meramente humano, mas pela assistência do Espírito de verdade (cf. Jo 14,26), e portanto absolutamente sem nenhum erro, desempenha a missão que lhe foi confiada de conservar sempre puras e íntegras as verdades reveladas; e pelo mesmo motivo transmite-as sem contaminação e sem lhes ajuntar nem subtrair nada. "Pois - como ensina o concílio Vaticano - o Espírito Santo foi prometido aos sucessores de Pedro não para que, por sua revelação, expressem doutrinas novas, mas para que, com sua assistência, guardassem com cuidado e expusessem fielmente a revelação transmitida pelos apóstolos, ou seja o depósito da fé". (4) Por essa razão, do consenso universal do magistério da Igreja, deduz-se um argumento certo e seguro para demonstrar a assunção corpórea da bem-aventurada virgem Maria. Esse mistério, pelo que respeita à glorificação celestial do corpo da augusta Mãe de Deus, não podia ser conhecido por nenhuma faculdade da inteligência humana só com as forças naturais. É, portanto, verdade revelada por Deus, e por essa razão todos os filhos da Igreja têm obrigação de a crer firme e fielmente. Pois, como afirma o mesmo concílio Vaticano, "temos obrigação de crer com fé divina e católica, todas as coisas que se contêm na palavra de Deus escrita ou transmitida oralmente, e que a Igreja, com solene definição ou com o seu magistério ordinário e universal, nos propõe para crer, como reveladas por Deus".(5)

Testemunhos da crença na assunção

13. Desde tempos remotíssimos, pelo decurso dos séculos, aparecem-nos testemunhos, indícios e vestígios desta fé comum da Igreja; fé que se manifesta cada vez mais claramente.

14. Os fiéis, guiados e instruídos pelos pastores, souberam por meio da Sagrada Escritura que a virgem Maria, durante a sua peregrinação terrestre, levou vida cheia de cuidados, angústias e sofrimentos; e que, segundo a profecia do santo velho Simeão, uma espada de dor lhe traspassou o coração, junto da cruz do seu divino Filho e nosso Redentor. E do mesmo modo, não tiveram dificuldade em admitir que, à semelhança do seu unigênito Filho, também a excelsa Mãe de Deus morreu. Mas essa persuasão não os impediu de crer expressa e firmemente que o seu sagrado corpo não sofreu a corrupção do sepulcro, nem foi reduzido à podridão e cinzas aquele tabernáculo do Verbo divino. Pelo contrário, os fiéis iluminados pela graça e abrasados de amor para com aquela que é Mãe de Deus e nossa Mãe dulcíssima, compreenderam cada vez com maior clareza a maravilhosa harmonia existente entre os privilégios concedidos por Deus àquela que o mesmo Deus quis associar ao nosso Redentor. Esses privilégios elevaram-na a uma altura tão grande, que não foi atingida por nenhum ser criado, excetuada somente a natureza humana de Cristo.

15. Patenteiam inequivocamente esta mesma fé os inumeráveis templos consagrados a Deus em honra da assunção de nossa Senhora, e as imagens neles expostas à veneração dos fiéis, que mostram aos olhos de todos este singular triunfo da santíssima Virgem. Muitas cidades, dioceses e regiões foram consagradas ao especial patrocínio e proteção da assunção da Mãe de Deus. Do mesmo modo, com aprovação da Igreja, fundaram-se Institutos religiosos com o nome deste privilégio. Nem se deve passar em silêncio que no rosário de nossa Senhora, cuja reza tanto recomenda esta Sé Apostólica, há um mistério proposto à nossa meditação, que, como todos sabem, é consagrado à assunção da santíssima Virgem ao céu.

Testemunho da liturgia

16. De modo ainda mais universal e esplendoroso se manifesta esta fé dos pastores e dos fiéis, com a festa litúrgica da assunção celebrada desde tempos antiquíssimos no Oriente e no Ocidente. Nunca os santos padres e doutores da Igreja deixaram de haurir luz nesta solenidade, pois, como todos sabem, a sagrada liturgia, "sendo também profissão das verdades católicas, e estando sujeita ao supremo magistério da Igreja, pode fornecer argumentos e testemunhos de não pequeno valor para determinar algum ponto da doutrina cristã".(6)

17. Nos livros litúrgicos em que aparece a festa da Dormição ou da Assunção de santa Maria, encontram-se expressões que de uma ou outra maneira concordam em referir que, quando a virgem Mãe de Deus passou deste exílio para o céu, por uma especial providência divina, sucedeu ao seu corpo algo de consentâneo com a dignidade de Mãe do Verbo encarnado e com os outros privilégios que lhe foram concedidos. É o que se afirma, para apresentarmos um exemplo elucidativo, no Sacramentário enviado pelo nosso predecessor de imortal memória Adriano I, ao imperador Carlos Magno. Nele se diz: "É digna de veneração, Senhor, a festividade deste dia, em que a santa Mãe de Deus sofreu a morte temporal; mas não pode ficar presa com as algemas da morte aquela que gerou no seu seio o Verbo de Deus encarnado, vosso Filho, nosso Senhor".(7)

18. Aquilo que aqui se refere com a sobriedade de palavras costumeiras na Liturgia romana, exprime-se mais difusamente nos outros livros das antigas liturgias orientais e ocidentais. OSacramentário Galicano, por exemplo, chama a esse privilégio de Maria, "inexplicável mistério, tanto mais digno de ser proclamado, quanto é único entre os homens, pela assunção da virgem". E na liturgia bizantina a assunção corporal da virgem Maria é relacionada diversas vezes não só com a dignidade de Mãe de Deus, mas também com os outros privilégios, especialmente com a sua maternidade virginal, decretada por um singular desígnio da Providência divina: "Deus, Rei do universo, concedeu-vos privilégios que superam a natureza; assim como no parto vos conservou a virgindade, assim no sepulcro vos preservou o corpo da corrupção e o conglorificou pela divina translação".(8)

A festa da Assunção

19. A Sé Apostólica, herdeira do múnus confiado ao Príncipe dos apóstolos de confirmar na fé os irmãos (cf. Lc 22,32), com sua autoridade foi tornando cada vez mais solene esta celebração. Esse fato estimulou eficazmente os fiéis a irem-se apercebendo mais e mais da importância deste mistério. E assim, a festa da assunção, que ao princípio tinha o mesmo grau de solenidade que as restantes festas marianas, foi elevada ao rito das festas mais solenes do ciclo litúrgico. O nosso predecessor S. Sérgio I, ao prescrever as ladainhas, ou a chamada procissão estacional, nas festas de nossa Senhora, enumera simultaneamente a Natividade, a Anunciação, a Purificação e a Dormição.(9) A festa já se celebrava com o nome de assunção da bem-aventurada Mãe de Deus, no tempo de S. Leão IV Esse papa procurou que se revestisse de maior esplendor, mandando ajuntar-lhe a vigília e a oitava. E o próprio pontífice quis participar nessas solenidades, acompanhado de imensa multidão. (10) Na vigília já de há muito se guardava o jejum, como se prova com evidência do que afirma o nosso predecessor S. Nicolau I, ao tratar dos principais jejuns "que... desde os tempos antigos observava e ainda observa a santa Igreja romana".(11)

20. A Liturgia da Igreja não cria a fé católica, mas supõe-na; e é dessa fé que brotam os ritos sagrados, como da árvore os frutos. Por isso os santos Padres e doutores nas homilias e sermões que nesse dia fizeram ao povo, não foram buscar essa doutrina à liturgia, como a fonte primária; mas falaram dela aos fiéis como de coisa sabida e admitida por todos. Declararam-na melhor, explicaram o seu significado e o fato com razões mais profundas, destacando e amplificando aquilo a que muitas vezes os livros litúrgicos apenas aludiam em poucas palavras, a saber, que com esta festa não se comemora somente a incorrupção do corpo morto da santíssima Virgem, mas principalmente o triunfo por ela alcançado sobre a morte e a sua celeste glorificação à semelhança do seu Filho unigênito, Jesus Cristo.

Testemunho dos santos Padres

21. S. João Damasceno, que entre todos se distingue como pregoeiro dessa tradição, ao comparar a assunção gloriosa da Mãe de Deus com as suas outras prerrogativas e privilégios, exclama com veemente eloqüência: "Convinha que aquela que no parto manteve ilibada virgindade conservasse o corpo incorrupto mesmo depois da morte. Convinha que aquela que trouxe no seio o Criador encarnado, habitasse entre os divinos tabernáculos. Convinha que morasse no tálamo celestial aquela que o Eterno Pai desposara. Convinha que aquela que viu o seu Filho na cruz, com o coração traspassado por uma espada de dor de que tinha sido imune no parto, contemplasse assentada à direita do Pai. Convinha que a Mãe de Deus possuísse o que era do Filho, e que fosse venerada por todas as criaturas como Mãe e Serva do mesmo Deus".(12)

22. Condizem com essas palavras de s. João Damasceno as de muitos outros que afirmam a mesma doutrina. E não são menos expressivas, nem menos exatas, as palavras que se encontram nos sermões proferidos pelos santos Padres mais antigos ou da mesma época, ordinariamente por ocasião dessa festividade. Assim, para citar outro exemplo, s. Germano de Constantinopla julgava que a incorrupção do corpo da virgem Maria Mãe de Deus, e a sua assunção ao céu são corolários não só da sua maternidade divina, mas até da santidade singular daquele corpo virginal: "Vós, como está escrito, aparecestes 'em beleza'; o vosso corpo virginal é totalmente santo, totalmente casto, totalmente domicílio de Deus de forma que até por este motivo foi isento de desfazer-se em pó; foi, sim, transformado, enquanto era humano, para viver a vida altíssima da incorruptibilidade; mas agora está vivo, gloriosíssimo, incólume e participante da vida perfeita".(13) Outro escritor antiquíssimo assevera por sua vez: "A gloriosíssima Mãe de Cristo, Deus e Salvador nosso, dador da vida e da imortalidade, foi glorificada e revestida do corpo na eterna incorruptibilidade, por aquele mesmo que a ressuscitou do sepulcro e a chamou a si duma forma que só ele sabe".(14)

23. À medida que a festa litúrgica se foi espalhando, e celebrando mais devotamente, maior foi o número de bispos e oradores sagrados que julgaram de seu dever explicar com toda a clareza o mistério que se venerava nesta solenidade e mostrar como ela estava intimamente relacionada com as outras verdades reveladas.

Testemunho dos teólogos

24. Entre os teólogos escolásticos, não faltaram alguns, que, pretendendo penetrar mais profundamente nas verdades reveladas, e mostrar o acordo entre a chamada razão teológica e a fé católica, notaram a estreita conexão existente entre este privilégio da assunção da santíssima Virgem e as demais verdades contidas na Sagrada Escritura.

25. Partindo desse pressuposto, apresentam diversas razões para corroborar esse privilégio mariano. A razão primária e fundamental diziam ser o amor filial de Cristo para o levar a querer a assunção de sua Mãe ao céu. E advertiam mais, que a força dos argumentos se baseava na incomparável dignidade da sua maternidade divina e em todas as graças que dela derivam: a santidade altíssima que excede a santidade de todos os homens e anjos, a íntima união de Maria com o seu Filho, e sobretudo o amor que o Filho consagrava a sua Mãe digníssima.

26. Muitas vezes os teólogos e oradores sagrados, seguindo os passos dos santos Padres,(15) para explicarem a sua fé na assunção, serviram-se com certa liberdade de fatos e textos da Sagrada Escritura. E assim, para mencionar só alguns mais empregados, houve quem citasse a este propósito as palavras do Salmista: "Erguei-vos, Senhor, para o vosso repouso, vós e a Arca de vossa santificação" (Sl 131, 8); e na Arca da Aliança, feita de madeira incorruptível e colocada no templo de Deus, viam como que uma imagem do corpo puríssimo da virgem Maria, preservado da corrupção do sepulcro, e elevado a tamanha glória no céu. Do mesmo modo, ao tratar desta matéria, descrevem a entrada triunfal da Rainha na corte celeste, e como se vai sentar a direita do divino Redentor (Sl 44,10.14-16); e recordam a propósito a esposa dos Cantares "que sobe pelo deserto, como uma coluna de mirra e de incenso" para ser coroada (Ct 3,6; cf. 4,8; 6,9). Ambas são propostas como imagens daquela Rainha e Esposa celestial, que sobe ao céu com o seu divino Esposo.

27. Os doutores escolásticos vislumbram igualmente a assunção da Mãe de Deus não só em várias figuras do Antigo Testamento, mas também naquela mulher, revestida de sol, que o apóstolo s. João contemplou na ilha de Patmos (Ap 12, ls.). Porém, entre os textos do Novo Testamento, consideraram e examinaram com particular cuidado aquelas palavras: "Ave, cheia de graça, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre as mulheres" (Lc 1,28), pois viram no mistério da assunção o complemento daquela plenitude de graça, concedida à santíssima Virgem, e uma singular bênção contraposta à maldição de Eva.

Na teologia escolástica

28. Por esse motivo, nos primórdios da teologia escolástica, o piedosíssimo varão Amadeu, bispo de Lausana, afirmava que a carne da virgem Maria permaneceu incorrupta - nem se pode crer que o seu corpo padecesse a corrupção -, porque se uniu de novo à alma, e juntamente com ela penetrou na corte celestial. "Pois ela era cheia de graça e bendita entre as mulheres (Lc 1,28). Só ela mereceu conceber o Deus verdadeiro do Deus verdadeiro, e sendo virgem deu-o à luz, amamentou-o, trouxe-o no regaço, e prestou-lhe todos os cuidados maternos".(16)

29. Entre os escritores sagrados que naquele tempo com vários textos, comparações e analogias tiradas das divinas Letras, ilustraram e confirmaram a doutrina da assunção em que piamente acreditavam, ocupa lugar primordial o doutor evangélico s. Antônio de Pádua. Na festa da assunção, ao comentar aquelas palavras de Isaías: "glorificarei o lugar dos meus pés" (Is 60,13), afirmou com segurança que o divino Redentor glorificou de modo mais perfeito a sua Mãe amantíssima, da qual tomara carne humana. "Daqui, vê-se claramente", diz, "que o corpo da santíssima Virgem foi assunto ao céu, pois era o lugar dos pés do Senhor". Pelo que, escreve o Salmista: "Erguei-vos, Senhor, para o vosso repouso, vós e a Arca da vossa santificação". E assim como, acrescenta ainda, Jesus Cristo ressuscitou triunfante da morte e subiu para a direita do Pai, assim também "ressuscitou a Arca da sua santificação, quando neste dia a virgem Mãe foi assunta ao tálamo celestial".(17)

No período áureo

30. Quando, na Idade Média, a teologia escolástica atingiu o maior esplendor, s. Alberto Magno, para demonstrar essa verdade, apresenta vários argumentos fundados na Sagrada Escritura, na tradição, na liturgia e em razões teológicas, e conclui: "Por estas e outras muitas razões e autoridades, é evidente que a bem-aventurada Mãe de Deus foi assunta ao céu em corpo e alma sobre os coros dos anjos. E cremos que isto é absolutamente verdadeiro".(18) E num sermão pregado em dia da Anunciação de nossa Senhora, ao explicar aquelas palavras do anjo: "Ave, cheia de graça...", o doutor universal compara a santíssima Virgem com Eva, e afirma clara e terminantemente que Maria foi livre das quatro maldições que caíram sobre Eva.(19)

31. O Doutor Angélico, seguindo as pisadas do mestre, ainda que nunca trate expressamente do assunto, no entanto sempre que se oferece a ocasião fala dele, e com a Igreja católica afirma que o corpo de Maria juntamente com a alma foi levado ao céu.(20)

32. É da mesma opinião, entre outros muitos, o Doutor Seráfico, o qual tem como certo que, assim como Deus preservou Maria santíssima da violação do pudor e da integridade virginal ao conceber e dar à luz o seu Filho, assim não permitiu que o seu corpo se desfizesse em podridão e cinzas.(21) Aplica a santíssima Virgem, em sentido acomodatício, aquelas palavras da Sagrada Escritura: "Quem é esta que sobe do deserto, cheia de gozo, e apoiada no seu amado?" (Ct 8,5), e raciocina desta forma: "Daqui pode concluir-se que ela está ali corporalmente (na glória celeste)... Porque... a sua felicidade não seria plena se ali não estivesse em pessoa; ora a pessoa não é só a alma, mas o composto; logo é claro que está ali segundo o composto, isto é, em corpo e alma; de outro modo não gozaria de felicidade plena".(22)

Na escolástica posterior

33. Na escolástica posterior, ou seja no século XV, são Bernardino de Sena, resumindo e ponderando cuidadosamente tudo quanto os teólogos medievais tinham escrito a esse propósito, não julgou suficiente referir as principais considerações que os antigos doutores tinham proposto, mas acrescentou outras novas. Por exemplo, a semelhança entre a divina Mãe e o divino Filho, no que respeita à perfeição e dignidade de alma e corpo - semelhança que nem sequer nos permite pensar que a Rainha celestial possa estar separada do Rei dos céus - exige absolutamente que Maria "só deva estar onde está Cristo".(23) Portanto, é muito conveniente e conforme à razão que tanto o corpo como a alma do homem e da mulher tenham alcançado já a glória no céu; e, finalmente, o fato de nunca a Igreja ter procurado as relíquias da santíssima Virgem, nem as ter exposto à veneração dos fiéis, constitui um argumento que é "como que uma experiência sensível" da assunção.(24)

Nos tempos modernos

34. Em tempos mais recentes, as razões dos santos Padres e doutores, acima aduzidas, foram usadas comumente. Seguindo o comum sentir dos cristãos, recebido dos tempos antigos s. Roberto Belarmino exclamava: "Quem há, pergunto, que possa pensar que a arca da santidade, o domicílio do Verbo, o templo do Espírito Santo tenha caído em ruínas? Horroriza-se o espírito só com pensar que aquela carne que gerou, deu a luz, alimentou e transportou a Deus, se tivesse convertido em cinza ou fosse alimento dos vermes".(25)

35. De igual forma s. Francisco de Sales afirma que não se pode duvidar que Jesus Cristo cumpriu do modo mais perfeito o divino mandamento que obriga os filhos a honrar os pais. E a seguir faz esta pergunta: "Que filho haveria, que, se pudesse, não ressuscitava a sua mãe e não a levava para o céu?"(26) E s. Afonso escreve por sua vez: "Jesus não quis que o corpo de Maria se corrompesse depois da morte, pois redundaria em seu desdouro que se transformasse em podridão aquela carne virginal de que ele mesmo tomara a própria carne".(27)

36. Quando já tinha aparecido em toda a sua luz o mistério que se celebra nesta festa, não faltaram doutores que, em vez de tratar das razões teológicas pelas quais se demonstrasse a absoluta conveniência de crença na assunção corpórea da Virgem santíssima, voltaram o pensamento para a fé da Igreja, mística esposa de Cristo, sem mancha nem ruga (cf. Ef 5,27), que o Apóstolo chama "coluna e sustentáculo da verdade" ( 1Tm 3,15). E apoiados nesta fé comum pensaram que seria temerária, para não dizer herética, a opinião contrária. S. Pedro Canísio, como outros muitos, depois de declarar que o termo assunção se referia à glorificação não só da alma mas também do corpo, e que a Igreja há muitos séculos venerava e celebrava solenemente este mistério mariano, observa: "Esta opinião é admitida há vários séculos e tão impressa na alma dos fiéis, é tão recomendada pela Igreja, que quem negasse a assunção ao céu do corpo de Maria santíssima nem sequer seria ouvido com paciência, mas seria vaiado como pertinaz, ou mesmo temerário, e imbuído mais de espírito herético do que católico".(28)

37. Pela mesma época, o Doutor Exímio estabelecia esta regra para a mariologia: "Os mistérios da graça que Deus operou na virgem Maria não se devem medir pelas leis ordinárias, senão pela onipotência divina, suposta a conveniência do fato e a não contradição ou repugnância com as Escrituras".(29) E apoiado na fé de toda a Igreja, podia concluir que o mistério da assunção devia crer-se com a mesma firmeza que o da imaculada conceição, e já então julgava que ambas as verdades podiam ser definidas.

Fundamento escriturístico

38. Todos esses argumentos e razões dos santos Padres e teólogos apóiam-se, em último fundamento, na Sagrada Escritura. Esta nos apresenta a Mãe de Deus extremamente unida ao seu Filho, e sempre participante da sua sorte. Pelo que parece quase que impossível contemplar aquela que concebeu, deu à luz, alimentou com o seu leite, a Cristo, e o teve nos braços e apertou contra o peito, estivesse agora, depois da vida terrestre, separada dele, se não quanto à alma, ao menos quanto ao corpo. O nosso Redentor é também filho de Maria; e como observador perfeitíssimo da lei divina não podia deixar de honrar a sua Mãe amantíssima logo depois do Eterno Pai. E podendo ele adorná-la com tamanha honra, preservando-a da corrupção do sepulcro, deve crer-se que realmente o fez.

39. E convém sobretudo ter em vista que, já a partir do século II, os santos Padres apresentam a virgem Maria como nova Eva, sujeita sim, mas intimamente unida ao novo Adão na luta contra o inimigo infernal. E essa luta, como já se indicava no Protoevangelho, acabaria com a vitória completa sobre o pecado e sobre a morte, que sempre se encontram unidas nos escritos do apóstolo das gentes (cf. Rm 5; 6; lCor 15,21-26; 54-57). Assim como a ressurreição gloriosa de Cristo constituiu parte essencial e último troféu desta vitória, assim também a vitória de Maria santíssima, comum com a do seu Filho, devia terminar pela glorificação do seu corpo virginal. Pois, como diz ainda o apóstolo, "quando... este corpo mortal se revestir da imortalidade, então se cumprirá o que está escrito: a morte foi absorvida na vitória" (1Cor 15,14).

40. Deste modo, a augustíssima Mãe de Deus, associada a Jesus Cristo de modo insondável desde toda a eternidade "com um único decreto" (30) de predestinação, imaculada na sua concepção, sempre virgem, na sua maternidade divina, generosa companheira do divino Redentor que obteve triunfo completo sobre o pecado e suas conseqüências, alcançou por fim, como suprema coroa dos seus privilégios, que fosse preservada da corrupção do sepulcro, e que, à semelhança do seu divino Filho, vencida a morte, fosse levada em corpo e alma ao céu, onde refulge como Rainha à direita do seu Filho, Rei imortal dos séculos (cf. 1Tm 1,17).

Oportunidade da definição

41. Considerando que a Igreja universal - que é assistida pelo Espírito de verdade, que a dirige infalivelmente para o conhecimento das verdades reveladas - no decurso dos séculos manifestou de tantas formas a sua fé; considerando que os bispos de todo o mundo quase unanimemente pedem que seja definida como dogma de fé divina e católica a verdade da assunção corpórea da santíssima Virgem ao céu; considerando que esta verdade se funda na Sagrada Escritura, está profundamente gravada na alma dos fiéis, e desde tempos antiquíssimos é comprovada pelo culto litúrgico, e concorda, inteiramente, com as outras verdades reveladas, e tem sido esplendidamente explicada e declarada pelos estudos, sabedoria e prudência dos teólogos - julgamos chegado o momento estabelecido pela providência de Deus, para proclamarmos solenemente este privilégio insigne da virgem Maria. (42). Nós, que colocamos o nosso pontificado sob o especial patrocínio da santíssima Virgem, à qual recorremos em tantas circunstâncias tristes, nós, que consagramos publicamente todo o gênero humano ao seu imaculado Coração, e que experimentamos muitas vezes o seu poderoso patrocínio, confiamos firmemente que esta solene proclamação e definição será de grande proveito para a humanidade inteira, porque reverte em glória da Santíssima Trindade, a qual a virgem Mãe de Deus está ligada com laços muito especiais. É de esperar também que todos os fiéis cresçam em amor para com a Mãe celeste, e que os corações de todos os que se gloriam do nome de cristãos se movam a desejar a união com o corpo místico de Jesus Cristo, e que aumentem no amor para com aquela que tem amor de Mãe para com os membros do mesmo augusto corpo. E também é lícito esperar que, ao meditarem nos exemplos gloriosos de Maria, mais e mais se persuadam todos do valor da vida humana, se for consagrada ao cumprimento integral da vontade do Pai celeste e a procurar o bem do próximo. Enquanto o materialismo e a corrupção de costumes que dele se origina ameaçam subverter a luz da virtude, e destruir vidas humanas, suscitando guerras, é de esperar ainda que este luminoso e incomparável exemplo, posto diante dos olhos de todos, mostre com plena luz qual o fim a que se destinam a nossa alma e o nosso corpo. E, finalmente, esperamos que a fé na assunção corpórea de Maria ao céu torne mais firme e operativa a fé na nossa própria ressurreição.

43. E é para nós motivo de imenso regozijo que este fato, por providência de Deus, se realize neste Ano santo que está a decorrer, e que assim possamos, enquanto se celebra este jubileu maior, adornar com esta pedra preciosa a fronte da Virgem santíssima, e deixar um monumento, mais perene que o bronze, da nossa ardente devoção para com a Mãe de Deus.

Definição solene do dogma

44. "Pelo que, depois de termos dirigido a Deus repetidas súplicas, e de termos invocado a paz do Espírito de verdade, para glória de Deus onipotente que à virgem Maria concedeu a sua especial benevolência, para honra do seu Filho, Rei imortal dos séculos e triunfador do pecado e da morte, para aumento da glória da sua augusta mãe, e para gozo e júbilo de toda a Igreja, com a autoridade de nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados apóstolos s. Pedro e s. Paulo e com a nossa, pronunciamos, declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que: a imaculada Mãe de Deus, a sempre virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial".

45. Pelo que, se alguém, o que Deus não permita, ousar, voluntariamente, negar ou pôr em dúvida esta nossa definição, saiba que naufraga na fé divina e católica.

46. Para que chegue ao conhecimento de toda a Igreja esta nossa definição da assunção corpórea da virgem Maria ao céu, queremos que se conservem esta carta para perpétua memória; mandamos também que, aos seus transuntos ou cópias, mesmo impressas, desde que sejam subscritas pela mão de algum notário público, e munidas com o selo de alguma pessoa constituída em dignidade eclesiástica, se lhes dê o mesmo crédito que à presente, se fosse apresentada e mostrada.

47. A ninguém, pois, seja lícito infringir esta nossa declaração, proclamação e definição, ou temerariamente opor-se-lhe e contrariá-la. Se alguém presumir intentá-lo, saiba que incorre na indignação de Deus onipotente e dos bem-aventurados apóstolos Pedro e Paulo.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no ano do jubileu maior, de 1950, no dia 1 ° de novembro, festa de todos os santos, no ano XII do nosso pontificado.

Eu PIO, Bispo da Igreja Católica assim definindo, subscrevi.


Notas

1. Petitiones de Assumptione corporea B. Virginis Mariae in caelum definienda ad S. Sedem delatae, 2 vol. Typis Polyglottis Vaticanis,1942.

2. Bula Ineffabilis Deus, Acta Pii IX, parte I, vol. 1, p. 615.

3. Cf. Conc. Vat. I, Const. dogm. Dei Filius de fide catholica, cap. 4.

4. Conc. Vat. I, Const. dogm. Pastor aeternus de Ecclesia Christi, cap. 4.

5. Conv Vat. I, Const. dogm. Dei Filius de feide catholica. cap. 3.

6. Carta Encíclica Mediator Dei, AAS 39( 1947), p. 541.

7. Sacramentário gregoriano.

8. Menaei totius anni..

9. Liber Pontificalis.

10. Ibid.

11. Responsa Nicolai Papae 1 ad Consulta Bulgarorum, 13 nov. 866.

12. S. João Damasc., Encomium in Dormitionem Dei Genetricis semperque Virginis Mariae, hom. II, 14; cf. também ibid. n. 3).

13. S. Germ. Const., In Sanctae Dei Genitricis Dormitionem, sermo 1.

14. Encomium in Dormitionem Sanctissimae Dominae nostrae Deiparae semperque Virginis Mariae [atribuído a S. Modesto de Jerusalém] n. 14.

15. Cf. S. João Damasc., Encomium in Dormitionem Dei Genetricis semperque Virginis Mariae, hom. II, 2, 11; Encomium in Dormitionem... [atribuído a S. Modesto de Jerusalém].

16. Amadeu de Lausana, De Beatae Virginis obitu, Assumptione in Caelum, exaltatione ad Filii dexteram.

17. S. Antônio de Pádua, Sermones dominicales et in solemnitatibus. In Assumptione S. Mariae Virginis Sermo.

18. S. Alberto Magno, Mariale sive quaestiones super Evang. "Missus est", q. 132.

19. Idem, Sermones de Sanctis, sermo XV: In Annuntiatione B. Mariae; cf. também Mariale, q.132.

20. Cf. Summa Theol. III, q. 27, a. 1. c.; ibid. q. 83, a. 5 ad 8; Expositio salutationis angelicae; In symb. Apostolorum expositio, art. 5; in IV Sent. D. 12, q. l, art. 3, sol. 3; D. 43, q. l, art. 3, sol. I e 2.

21. Cf. S. Boaventura, De Nativitate B. Mariae Virginis, sermo 5.

22. S. Boaventura, De Assumptione B. Mariae Virginis, sermo 1.

23. S. Bernardino de Sena, In Assumptione B. M. Virginis, sermo 2.

24. Idem, l.c.

25. S. Roberto Belarmino, Conciones habitae Lovanii, concio 40: De Assumptione B. Mariae Virginis.

26. Oeuvres de S. François de Sales, Sermon autographe pour la fête de l'Assomption.

27. S. Afonso Maria de Ligório, As glórias de Maria, parte II, disc. 1.

28. S. Pedro Canísio, De Maria Virgine.

29. E Suárez, In tertiam partem D. Thomae, q. 27, art. 2, disp. 3, sect. 5, n. 31.

30. Bula Ineffabilis Deus, l.c, p. 599.

O DOM MAIS PRECIOSO

Certa vez um missionário batizou um indígena, a quem também deu a Primeira Comunhão. O jovem no seu fervor tomou a resolução de viver na graça de Deus evitando o pecado a todo custo.

Um ano se passou e o missionário voltou a aldeia do jovem e este logo o procurou padre para comungar. O padre falou que tudo bem e disse ao jovem que se preparasse para se confessar. Ao que o índio retrucou que não precisava. "Como?" respondeu o padre. "Já faz quase um ano deste a sua primeira comunhão "

O jovem então disse que sossegadamente podia comungar pois não cometera nenhum pecado mortal no período e frisou: "O senhor acha admissível, Padre, que após estar na graça de Deus, após receber a Nosso Senhor na Sagrada Comunhão alguém a traí-lo pelo pecado?" O padre emocionado e feliz com isso deu a comunhão ao moço que tanto a queria receber.

Esse fato que lemos há muitos anos um livro piedoso nos fez refletir. Fez pensar como poucos se esforçam por viver em estado de graça, faz pensar também e com tristeza que muitos comungam em pecado mortal, faz enfim ver como é bela uma alma que vive na graça de Deus e como é sublime e maravilhosa a vida na amizade com Deus.

Não há tesouro do mundo que a isso se compare, não há maior alegria nesta vida terrena, não há bem maior.

O que são as riquezas, a fama e os prazeres diante da vida em estado de graça? São - usando-se uma figura - menos que nada. São ilusões fugazes e passageiras que somem como vento que passa.

Rezemos uma Ave Maria à Nossa Senhora, àquela que foi saudada pelo Arcanjo como Cheia de Graça, que Ela nos faça ter a Graça de Deus se estamos no pecado, e nos faça conservá-la quando nela estamos.

Ato de Reparação ao Sacratíssimo Coração de Jesus


Dulcíssimo Jesus, cuja infinita caridade para com os homens é deles tão ingratamente correspondida com esquecimentos, friezas e desprezos, eis-nos aqui prostrados, diante do vosso altar, para vos desagravar-mos, com especiais homenagens, da insensibilidade tão insensata e das nefandas injúrias com que é de toda parte alvejado o vosso dulcíssimo Coração. Reconhecendo, porém, com a mais profunda dor, que também nós, mais de uma vez, cometemos as mesmas indignidades, para nós, em primeiro lugar, imploramos a vossa misericórdia, prontos a expiar não só as próprias culpas, mas também as daqueles que, errando longe do caminho da salvação, ou se obstinam na

sua infidelidade não Vos querendo como pastor e guia, ou, faltando às promessas do batismo, sacudiram o suavíssimo jugo da vossa santa Lei.

De todos estes tão deploráveis crimes, Senhor, queremos nós hoje desagravar-vos, mas particularmente dos costumes e imodéstias do vestir, de tantos laços de corrupção armados à inocência, da violação dos dias santificados, das execrandas blasfêmias contra Vós e vossos santos, dos insultos ao vosso vigário e a todo o vosso clero, do desprezo e das horrendas e sacrílegas profanações do Sacramento do divino Amor, e enfim, dos atentados e rebeldias oficiais das nações contra os direitos e o magistério da vossa Igreja.

Oh, se pudéssemos lavar com o próprio sangue tantas iniqüidades! Entretanto, para reparar a honra divina ultrajada, vos oferecemos, juntamente com os merecimentos da Virgem Mãe, de todos os santos e almas piedosas, aquela infinita satisfação que Vós oferecestes ao Eterno Pai sobre a cruz, e que não cessais de renovar todos os dias sobre os nossos altares.

Ajudai-nos, Senhor, com o auxílio da vossa graça, para que possamos, como é nosso firme propósito, com a viveza da fé, com a pureza dos costumes, com a fiel observância da lei e caridade evangélicas, reparar todos os pecados cometidos por nós e pelos nossos próximos, impedir por todos os meios novas injúrias à vossa divina Majestade e atrair ao vosso serviço o maior número de almas possível.

Recebei, oh! benigníssimo Jesus, pelas mãos de Maria Santíssima Reparadora, a espontânea homenagem deste nosso desagravo, e concedei-nos a grande graça de perseverarmos constantes até á morte no fiel cumprimento dos nossos deveres e no vosso santo serviço, para que possamos chegar todos à Pátria bem-aventurada, onde Vós, com o Pai e o Espírito Santo, viveis e reinais, Deus, por todos os séculos dos séculos. Assim seja.


13. (“Miserentissimus Redemptor”, Carta Encíclica de Pio XI sobre o dever da reparação ao Sagrado Coração de Jesus de 8 de Maio de 1928)




MANSIDÃO COM OS PECADORES

(SÃO FRANCISCO DE SALES)

CAPÍTULOS XV E XVI DO LIVRO X DA OBRA: "TRATADO DO AMOR DE DEUS" ou "TEÓTIMO", DE SÃO FRANCISCO DE SALES, BISPO E DOUTOR DA IGREJA

CAPÍTULO XV: AVISOS PARA A DIREÇÃO DO SANTO ZELO

Visto ser o zelo um ardor e veemência de amor, precisa ser prudentemente conduzido, do contrário violaria os termos da modéstia e da discrição; não, de certo, que o divino amor, por mais veemente que seja, possa ser excessivo em si mesmo, nem nos movimentos ou inclinações que dá aos espíritos; mas, por isso que ele emprega na execução dos seus projetos o intelecto, ordenando-lhe procurar os meios de os fazer sair bem, e a ousadia ou cólera para vencer as dificuldades que encontra, mui frequentemente sucede que o intelecto propõe e faz tomar caminhos demasiado ásperos e violentos, e que, sendo a cólera ou audácia uma vez movida, e não se podendo conter dentro dos limites da razão, arrebata o coração na desordem, de sorte que por esse meio o zelo é exercido indiscreta e desregradamente, o que o torna mau e censurável.

Davi enviou Joab com seu exército contra o seu desleal e rebelde filho Absalão, proibindo-lhe sobre todas as coisas tocar nele, e ordenando que, em quaisquer circunstâncias se tivesse o cuidado de salvá-lo. Mas, estando em obra, Joab, encandecido na demanda da vitória, com sua própria mão matou o pobre Absalão, sem ter em consideração nada do que o rei lhe dissera.

Assim também o zelo emprega a cólera contra o mal, e ordena-lhe sempre mui expressamente que, destruindo a iniqüidade e o pecado, salve, se possível, o pecador e o iníquo.

Porém, estando uma vez em ímpeto, como um cavalo teimoso e capricoso, desembesta, carrega o homem para fora da estrada, e não pára jamais, enquanto durar-lhe o fôlego.

Aquele bom pai de família que Nosso Senhor descreve no Evangelho bem conheceu que os servos ardentes e violentos costumam ultrapassar a intenção do seu amo, porquanto, oferecendo-se-lhes os seus para irem limpar o campo, a fim de arrancar dele o joio, ele lhes disse: "Não, não o quero, com medo de que porventura com o joio arranqueis também o trigo" (Mat 13, 28-29).

De certo, Teótimo, a cólera é um servo que, sendo poderoso, corajoso e grande empreendedor, faz também a princípio muito bom trabalho; mas é tão ardente, tão irrequieto, tão inconsiderado e impetuoso, que não faz nenhum bem sem que, ordinariamente, faça ao mesmo tempo vários males.

Ora, diz a nossa gente dos campos que não é bom negócio ter pavões em casa; porque, embora eles cacem as aranhas e livrem delas a casa, todavia estragam tanto as coberturas e o teto, que a sua utilidade não é comparável ao estrago que eles fazem.

A cólera é um socorro dado pela natureza à razão, e empregado pela Graça a serviço do zelo para a execução dos seus desígnios, porém socorro perigoso e pouco desejável; pois, se ela [a cólera] vem forte, torna-se senhora, derrubando a autoridade da razão e as leis amorosas do zelo. E, se vem fraca, não faz nada que o simples zelo não fizesse sozinho, sem ela; e sempre ela nos mantêm num justo receio de que, reforçando-se, se apodere do coração e do zelo, submetendo-os à sua tirania, tal como um fogo artificial que, num momento, abrasa um edifício, e a gente não sabe como apagá-lo. Ora, é um ato de desespero pôr numa praça de guerra um socorro estranho que, a qualquer momento, pode tornar-se o mais forte.

O amor-próprio engana-nos muito, exercendo as suas próprias paixões sob o nome de zelo.

Outrora o zelo serviu-se alguma vez da cólera; e agora, em compensação, a cólera serve-se do nome de zelo, para, sob ele, manter a coberto o seu desregramento ignominioso. Ora, eu digo que ela se serve do nome de zelo, porque não saberia servir-se do zelo em si mesmo, visto ser próprio de todas as virtudes, e sobretudo da caridade, da qual o zelo é uma dependência, ser tão boa que ninguém pode abusar dela.

Um pecador famoso veio um dia lançar-se aos pés de um bom e digno sacerdote, protestando com muita submissão vir achar o remédio de seus males, isto é, para receber a santa absolvição de suas faltas. Um certo monge chamado Demófilo, achando, no seu entender, que aquele pobre penitente se aproximava demais do santo altar, entrou em cólera tão violenta que, precipitando-se sobre ele a grandes pontapés, expulsou-o e enxotou-o dali, injuriando ultrajantemente o bom do sacerdote que, consoante o seu dever, docemente acolhera aquele pobre penitente; depois, o referido monge, correndo ao altar, tirou dele as coisas santíssimas que ali estavam e carregou-as, com medo, como queria fazer crer, de que pela aproximação do pecador o lugar houvesse sido profanado.

Ora, tendo feito essa bela façanha de 'zelo', ele não ficou nisso, mas festejou-a grandemente junto ao grande São Dionísio Areopagita, através de uma carta que lhe escreveu sobre isso, da qual recebeu uma resposta digna do espírito apostólico de que era animado essa grande discípulo de São Paulo. Pois São Dionísio lhe fez ver que o seu zelo fôra indiscreto, imprudente e impudente conjuntamente, visto que, embora o zelo devido à honra das coisas santas seja bom e louvável, todavia fôra praticado contra toda razão, sem consideração nem julgamento algum, dado que ele empregara os pontapés, os ultrajes, injúrias e exprobações num lugar, numa ocasião, e contra pessoas, a quem devia honrar, amar e respeitar; de modo que este zelo não podia ser bom, exercido como era com tamanha desordem. Mas nessa mesma resposta São Dionísio relata outro exemplo admirável de um grande zelo procedente de uma alma muito boa, estragada todavia e viciada pelo excesso da cólera:

Um pagão seduzira e fizera voltar à idolatria um cristão recém-convertido à Fé. Carpo, homem eminente em pureza e santidade de vida, e que, provavelmente, era o bispo de Candia, concebeu por isso tamanha cólera como jamais sofrera tal, e deixou-se arrastar tanto por essa paixão que, levantando-se à meia-noite para rezar como era seu costume, concluiu consigo mesmo não ser razoável que os homens ímpios vivessem mais, e rogava à Justiça Divina que matasse com um raio aqueles dois pecadores juntos, o pagão sedutor e o cristão seduzido.

Vede, porém, Teótimo, o que Deus fez para corrigir a aspereza da paixão de que o pobre Carpo estava dominado.

Primeiramente, fez-lhe ver, como a outro Santo Estevão, o Céu todo aberto, e Jesus Cristo Nosso Senhor sentado num grande trono, rodeado por uma multidão de Anjos que Lhe assistiam; depois ele viu em baixo a terra aberta como um horrível e vasto abismo, e os dois desviados, a quem ele desejara tanto mal, à beira desse precipício, trêmulos e quase desmaiados de pavor, por estarem prestes a cair lá dentro, empurrados ainda de um lado por uma multidão de serpentes que, saindo do abismo, se lhes enroscavam nas pernas e com as caudas lhes faziam cócegas e os provocavam à queda; e, do outro lado, por certos homens que os empurravam e batiam para os fazerem cair, de modo que eles estavam ao ponto de serem tragados por aquele precipício.

Ora, considerai, rogo-vos, Teótimo, a violência da paixão de Carpo. Porque, conforme ele mesmo contou depois a São Dionísio, ele não fazia caso de contemplar Nosso Senhor e os Anjos que se mostravam no Céu, tanto prazer achava em ver em baixo a angústia daqueles dois míseros maus, incomodando-se apenas do fato de eles demorarem tanto a perecer, e queria empurrá-los ele mesmo, e não o podendo logo, irritava-se com isso e maldizia, até que enfim, levantando os olhos ao Céu, viu o meigo e mui compassivo Salvador que, por uma extrema piedade e compaixão do que se passava, se levantou do Seu trono e, descendo até o lugar onde estavam aqueles dois pobres miseráveis, lhes estendeu Sua mão, ao mesmo tempo que os Anjos também, uns de um lado, outros doutro, os retinham para impedi-los de caírem naquele tremendo abismo; e, por conclusão, o amável e bondoso Jesus, dirigindo-se ao colérico Carpo, diz: "Olha, Carpo, bate agora em mim; pois estou pronto a padecer mais uma vez para salvar os homens; e isto me seria agradável, se pudesse suceder sem o pecado de outros homens. Porém, ademais, reflete o que te seria melhor: estar neste abismo com as serpentes, ou ficar com os Anjos, que são tão grandes amigos dos homens".

Teótimo, o santo homem Carpo tinha razão de entrar em zelo por aqueles dois homens, e o seu zelo excitara justamente a cólera contra eles; porém, uma vez movida, a cólera deixara a razão e o zelo para trás, ultrapassando as fronteiras e limites do santo amor, e, por conseguinte, do zelo, que é o fervor deste. Mudara o ódio do pecado em ódio do pecador, e a dulcíssima caridade em furiosa crueldade.

Assim há pessoas que pensam que não se possa ter muito zelo se não se tem muita cólera, achando não poderem acomodar coisa alguma sem estragarem tudo, conquanto, ao contrário, o verdadeiro zelo quase nunca se serve da cólera; porque, assim como não se aplica o ferro e o fogo aos doentes senão quando não se pode fazer de outro modo, assim também o santo zelo não emprega a cólera senão nas extremas necessidades.

CAPÍTULO XVI:

QUE O EXEMPLO DE VÁRIOS SANTOS, QUE PARECEM TER EXERCIDO O SEU ZELO COM CÓLERA, NÃO PREVALECE CONTRA O AVISO DO CAPÍTULO PRECEDENTE

Verdade é, por certo, meu amigo Teótimo, que Moisés, Finéias, Elias, Matatias e vários grandes servos de Deus se serviram da cólera para exercer o seu zelo em muitas ocasiões assinaladas; mas rogo-vos queirais notar que eram também grandes personagens, que sabiam manejar bem as suas paixões e dominar a sua cólera, semelhantes àquele bravo capitão do Evangelho que "dizia aos seus soldados: Ide, e eles iam; Vinde, e eles vinham" (Mat 8,9).

Mas nós outros, que somos quase todos certa gentinha, não temos tanto poder assim sobre os nossos movimentos: o nosso cavalo não é tão bem adestrado que o possamos impelir e fazer parar segundo nosso querer.

Os cães sabidos e bem ensinados avançam ou voltam, conforme o caçador lhes fala; porém, os cães novos, aprendizes, desgarram-se e são desobedientes.

Os grandes Santos, que tornaram prudentes as suas paixões à força de mortificá-las pelo exercício das virtudes, podem também virar sua cólera em qualquer direção, lançá-la e puxá-la, como bem lhes parecer.

Mas nós outros, que temos paixões indômitas, jovens, ou pelo menos mal ensinadas, não podemos soltar a nossa ira senão com risco de muita desordem; porque, estando ela uma vez em campo, já não se

pode retê-la nem submetê-la como seria necessário.

Falando àquele Demófilo que queria dar o nome de zelo à sua raiva e fúria, São Dionísio diz:

"Aquele que quer corrigir os outros deve primeiramente ter o cuidado de impedir que a cólera desbanque a razão do império e domínio que Deus lhe deu sobre a alma, acabando por excitar uma revolta, sedição e confusão em nós mesmos. De maneira que não aprovamos as vossas impetuosidades suscitadas por um zelo indiscreto, ainda quando mil vezes repetísseis Finéias e Elias: pois tais palavras não agradaram a Jesus Cristo qaundo Lhe foram ditas por Seus discípulos, que ainda não haviam participado daquele espírito manso e benigno".

Finéias, Teótimo, vendo um infeliz israelita ofender a Deus com uma moabita, matou-os a ambos.

Elias predissera a morte de Ocosias, que, indignado com essa predição, enviou dois capitães, um após o outro, cada um com cinqüenta soldados, para prendê-lo, e o homem de Deus fez descer fogo do céu que os devorou.

Ora, um dia em que passava pela Samaria, Nosso Senhor enviou discípulos a uma cidade para ali Lhe arranjarem pousada; mas os habitantes, sabendo que Nosso Senhor era judeu de nação, e que ia para Jerusalém, não quiseram alojá-lO. Vendo isso, São João e São Tiago disseram a Nosso Senhor: "Quereis que mandemos ao fogo do céu que desça e os consuma?" E Nosso Senhor, voltando-se para eles, repreendeu-os dizendo: "Não sabeis de que espírito sois. O Filho do homem não veio para perder as almas, mas para salvá-las" (Lc 9, 54ss).

É isso, pois, Teótimo, que São Dionísio quer dizer a Demófilo, que alegava o exemplo de Finéias e de Elias: pois São João e São Tiago, que queriam imitar Elias em fazer descer fogo do céu sobre os homens, foram repre

endidos por Nosso Senhor, que lhes queria fazer entender que o Seu espírito e o Seu zelo, dele Nosso Senhor, era doce, bondoso e gracioso; que Ele não empregava a indignação e a cólera senão raríssimamente, quando não havia mais esperança de poder aproveitar de outro modo.

Estando São Tomás de Aquino, este grande astro da teologia, doente da doença de que morreu no mosteiro cisterciense de Fossanuova, pediram-lhe os religiosos fazer-lhes uma breve exposição do sagrado Cântico dos Cânticos, à imitação de São Bernardo. E ele lhes respondeu: "Meus caros padres, dai-me o espírito de São Bernardo, e interpretarei esse divino cântico como São Bernardo".

Assim também, por certo, se nos disserem, a nós pequenos cristãos, miseráveis, imperfeitos e mesquinhos: 'Servi-vos da ira e da indignação no vosso zelo, como Finéias, Elias, Matatias, São Pedro e São Paulo', devemos responder: 'Dai-nos o espírito de perfeição e de puro zelo, com a luz interior desses grandes Santos, e animar-nos-emos de cólera como eles'.

Nem a todos pertence o saber encolerizar-se quando preciso e como preciso.

Esses grandes Santos eram inspirados por Deus imediatamente, e portanto podiam, sem perigo, empregar bem a sua cólera; pois o mesmo Espírito que os animava a essas façanhas segurava também as rédeas da sua justa cólera, a fim de que esta não ultrapassasse os limites que Ele lhes prefixara.

Uma ira que é inspirada ou excitada pelo Espírito Santo já não é a ira do homem; e é da ira de homem que é preciso fugir, visto que, como diz o glorioso São Tiago, ela não opera a justiça de Deus (Tg 1, 20).

E, efetivamente, quando aqueles grandes servos de Deus empregaram a cólera, era para ocorrências tão solenes e crimes tão excessivos, que não havia perigo nenhum de exceder a culpa pela pena.

Pelo fato de uma vez o grande Paulo chamar aos gálatas de "insensatos", representar aos creten

ses as suas más inclinações, e resistir em face ao glorioso São Pedro, seu superior, dever-se-á tomar a licença de injuriar os pecadores, censurar as nações, fiscalizar e censurar os nossos condutores e prelados?

Certamente, cada um não é São Paulo, para saber fazer as coisas oportunamente...

Mas os espíritos azedos, mal humorados, presunçosos e maldizentes, servindo às suas más inclinações, maus humores, aversões e presunções, querem cobrir a sua injustiça com o manto do zelo, e cada um, sob o nome desse fogo sagrado, deixa-se abrasar por suas próprias paixões.

O zelo da salvação das almas faz desejar a prelatura - ao que diz tal ambicioso; faz correr para cá e para lá o monge destinado ao coro - ao que diz tal espírito inquieto; leva a fazer rudes censuras e murmurações contra os prelados da Igreja e contra os príncipes temporais - ao que diz tal arrogante.

Só se fala de zelo e não se vê zelo, mas apenas maledicências, cóleras, ódios, invejas e inquietações do espírito e da língua.

Pode-se praticar o zelo de três modos:

Primeiramente, fazendo grandes ações de justiça para repelir o mal, e só pertence aos que têm ofício público de corrigir, censurar e repreender em qualidade de superiores, como os príncipes, magistrados, prelados, pregadores; mas, por ser respeitável, cada qual quer se meter nele.

Em segundo lugar, usa-se do zelo fazendo grandes ações de virtude, para dar bom exemplo, sugerindo os remédios para o mal, exortando a empregá-los, operando o bem oposto ao mal que se deseja exterminar; coisa esta que pertence a cada um, e não obstante pouca gente a quer fazer.

Enfim, exerce-se o zelo muito excelentemente sofrendo e padecendo muito para impedir e desviar o mal - e quase ninguém quer esta espécie de zelo.

O zelo especioso é ambicionado, e é aquele em que cada um quer empregar o seu talento, sem reparar em que não é o zelo o que aí se procura, e sim a glória e o saciamento da presunção, da cólera, da mágoa e de outras paixões.

Certamente, o zelo de Nosso Senhor manifestou-se principalmente em morrer Ele na Cruz para destruir a morte e o pecado dos homens; coisa em que Ele foi sumamente imitado por aquele admirável vaso de eleição e de dileção [São Paulo] (At 9, 15), como o representa o grande São Gregório Nazianzeno em palavras douradas; pois, falando desse santo Apóstolo, diz: "Ele combate por todos, derrama orações por todos, é apaixonado até o ciúme para com todos, inflama-se por todos; antes mesmo, ousou mais do que isso por seus irmãos segundo a carne; de sorte que, para eu mesmo dizer isto muito ousadamente, por caridade ele deseja que eles sejam postos no lugar dele junto a Jesus Cristo (Rm 9, 3). Ó excelência de coragem e de incrível fervor de espírito! Ele imita Jesus Cristo, que "por nós foi feito maldição, que tomou sobre si as nossas enfermidades e carregou as nossas dores" (Gl 3, 13; Mat 8, 17), ou, falando eu mais sobriamente, em primeiro depois do Salvador, Paulo não recusa sofrer e ser reputado ímpio por causa deles".

Portanto, Teótimo, assim como Nosso Senhor foi açoitado, condenado, crucificado na qualidade de homem votado, destinado e dedicado a carregar e suportar os opróbrios, ignomínias e punições devidas a todos os pecadores do mundo, e a servir de sacrifício geral pelo pecado, tendo sido feito como que anátema, separado e abandonado de Seu Pai Eterno, assim também, segundo São Gregório Nazianzeno, o glorioso Apóstolo São Paulo desejou ser coberto de ignomínia, crucificado, separado, abandonado e sacrificado pelo pecado dos judeus, a fim de suportar por eles o anátema e a pena que eles mereciam. (...)

Oh! diz Santo Ambrósio, como é feliz aquele que sabe a disciplina do zelo!

Facilimamente, diz São Bernardo, o diabo zombará do teu zelo, se desprezares a ciência.

Seja, pois, teu zelo inflamado de caridade, embelezado de ciência, robustecido de constância.

O verdadeiro zelo é filho da caridade, pois é o ardor dela; e é por isso que ele, como ela, é paciente, benigno, sem perturbação, sem contendas, sem ódio, sem inveja, alegrando-se com a verdade (1 Cor 13, 4-6).

O ardor do verdadeiro zelo é semelhante ao do caçador, que é diligente, cuidadoso, ativo, laborioso, e muito afeiçoado à procura, mas sem cólera, sem ira, sem perturbação; pois, se o trabalho dos caçadores fosse colérico, iracundo, desgostoso, não seria tão amado nem desejado.

E do mesmo modo o verdadeiro zelo tem ardores extremos, mas constantes, firmes, suaves, laboriosos, igualmente amáveis e infatigáveis; muito pelo contrário, o falso zelo é turbulento, brigão, insolente, arrogante, colérico, passageiro, igualmente impetuoso e inconstante.

Inquisição

EM CIMA DO MURO

Havia um grande muro separando dois grandes grupos. De um lado do muro estavam Deus, os anjos e os servos leais de Deus. Do outro lado do muro estavam Satanás, seus demônios e todos os humanos que não servem a Deus.
E em cima do muro havia um jovem indeciso, que havia sido criado num lar cristão, mas que agora estava em dúvida
se continuaria servindo a Deus ou se deveria aproveitar um pouco os prazeres do mundo.

O jovem indeciso observou que o grupo do lado de Deus chamava e gritava sem parar para ele:
- Ei, desce do muro agora... Vem pra cá!
Já o grupo de Satanás não gritava e nem dizia nada.
Essa situação continuou por um tempo, até que o jovem indeciso resolveu perguntar a Satanás:
- O grupo do lado de Deus fica o tempo todo me chamando para descer e ficar do lado deles.
Por que você e seu grupo não me chamam e nem dizem nada para me convencer a descer para o lado de vocês?
Grande foi a surpresa do jovem quando Satanás respondeu:

- É PORQUE O MURO É MEU.

Nunca se esqueça:
Não existe meio termo.
O muro já tem dono.

Papai Noel existiu?

A imagem do Papai Noel, o gordo e sorridente velhinho que traz presentes às crianças boas no dia de Natal, teve sua origem na história de São Nicolau.

Nicolau nasceu em uma antiga província da Ásia Menor, no século IV. A capital, Mira, estava perto do mar (hoje, para o sudoeste da Turquia) e foi uma sede episcopal. Nicolau foi escolhido bispo deste lugar e, em seguida, tornou-se famoso pela sua extraordinária devoção. Ele foi preso por defender sua fé durante a perseguição de Diocleciano. Suas relíquias estão na cidade de Bari, Itália.

Existem muitas lendas que falam da vida deste santo:

É dito que ele era herdeiro de uma fortuna, que ele se dedicou a ajudar os pobres que ele conhecia. Nicolauficou feliz ajudando os outros, especialmente os pobres e escravos. Foi bom, generoso e tinha um ótimo senso de humor.

Em uma ocasião, o chefe da guarda romana da época, chamado Marcos, queria vender como escravo um menino muito pequeno chamado Adrian e Nicolau o impediu.

Em outra ocasião, Marco queria pegar algumas meninas, se o pai não pagasse uma dívida. Nicolau soube do problema e decidiu ajudar. Tomou três sacos de ouro na véspera de Natal, em plena escuridão, chegou à casa e jogou os sacos pela chaminé, salvando assim as meninas.

Marco queria acabar com a fé cristã, mandou queimar todas as igrejas e prender todos os cristãos que não iria renunciar a sua fé. É assim que Nicolau foi detido e preso.

Quando o Imperador Constantino, convertido à fé católica, libertou todos os cristãos e Nicolau era velho. Quando ele saiu da prisão, ele estava barbudo e vestindo suas roupas brancas e vermelhas, que se distinguiu como um bispo. No entanto, os longos anos de prisão não ter sua gentileza e bom humor.


Os cristãos da Alemanha tomaram a história dos três sacos de ouro fundido pela chaminé no dia de Natal e a imagem de Nicolau ao sair da cadeia, para tecer a história de Papai Noel, sorridente, gordinho velhinho, vestido de vermelho, desce pela chaminé no dia de Natal de presentes às crianças boas.


O nome do Papai Noel vem da evolução gradual do nome de São Nicolau: St. Nicklauss, St. Nick, St. Klauss, Santa Claus, o Papai Noel.


MEDITAÇÃO DE SANTO AFONSO - SOBRE O JUÍZO E O INFERNO

Sobre o Juízo

1.Considera que, logo que a alma tenha saído do corpo, será conduzida ao tribunal de Deus para ser julgada.O Juiz é um Deus Onipotente, ultrajado por ti, e sumamente irado.Os acusadores são os demônios, teus inimigos; o processo teus próprios pecados; a sentença é inapelável; a pena é o inferno.Ali não há companheiros, nem parentes, nem amigos; a causa será resolvida entre Deus e a tua alma.Então compreenderás a hediondez de teus pecados, e não poderás ser tão indulgente com eles, como agora o és.Responderá por teus pecados de pensamentos, palavras, obras, omissão, escândalo, respeitos humanos: tudo se há de pesar naquela grande balança da justiça divina, e se fores encontrado réu de culpa grave, uma só que seja, estarás perdido.Meu Jesus e meu Juiz, perdoai-me antes de me fazer comparecer em vosso tribunal!.

2.Considera que a justiça divina há de julgar a todos os homens no vale de Josaphat, quando no fim do mundo ressuscitar os corpos para receberem juntamente com as almas prêmio ou castigo, segundo os seus méritos.

Reflete que, se te condenares, tornarás a unir-te a este mesmo corpo, que servirá de prisão eterna á tua alma desgraçada.Naquele encontro desagradável a alma amaldiçoará o corpo, e o corpo por sua vez amaldiçoará a alma; de maneira que a alma e o corpo, que agora correm de mãos dadas em busca de prazeres lícitos, unir-se-ão, em que lhes pese, depois da morte, para ser verdugos um do outro.Ao contrário, se te salvares, esse teu corpo ressuscitará formosíssimo, impassível e resplandecente; e assim irás, em corpo e alma, gozar d vida bem-aventurada.Tal será o fim da cena deste mundo!Afundar-se-ão no nada todas as grandezas, prazeres e pompas mundanas.Tudo acabará: só ficarão as duas eternidades, uma de glória e outra de pena, uma ditosa e outra infeliz, uma de gozos, e outra de tormentos: no céu os justos, no inferno os pecadores.Desgraçado então o que tenha feito do mundo o seu ídolo, e pelos prazeres miseráveis desta terra tenha perdido tudo, alma, corpo, bem-aventurança e Deus!.

3.Considera a sentença eterna.O Juiz eterno, Jesus Cristo, voltar-se-á primeiro contra os réprobos, a quem dirás: "Ingratos, tudo se acabou para vós!Chegou a minha hora, hora de verdade e justiça, hora de indignação e vingança!Criminosos, amastes a maldição; caia sobre vós: sede malditos na eternidade: ide para o fogo eterno, privados de todos os bens e sob o peso de todos os males".Em seguida voltar-se-á para os escolhidos e dirá: "Vinde vós, meus filhos queridos, vinde possuir o reino dos céus, que vos está preparado.Vinde não já para levar a cruz em pós de Mim, mas para partilhar da minha coroa.Vinde como herdeiros de minhas riquezas e companheiros de minha glória.Vinde cantar eternamente minhas misericórdias.Vinde da terra do exílio á pátria, da miséria ao gozo, das lágrimas á alegria, do sofrimento ao descanso eterno".Meu Jesus, eu espero ser também um destes filhos afortunados.Amo-Vos sobre todas as coisas, abençoai-me desde este momento, e abençoai-me também vós, ó Maria minha querida Mãe!.

Fruto I.Farei todas as minhas ações como se devesse comparecer, na ocasião em que as executar, perante o tribunal divino a dar conta delas.

Fruto II.Exercitar-me-ei em obras de misericórdia espirituais e corporais, porque ao que as praticar prometeu Deus uma benção eterna no dia do juízo.


MEDITAÇÃO SOBRE O INFERNO


1.Considera que o inferno é uma prisão hedionda, cheia de fogo.Neste fogo estão submersos os condenados.Neste abismo de fogo que os rodeia por todos os lados, têm chamas na boca, nos olhos, em todas as partes do corpo.Cada sentido tem seu sofrimento próprio: os olhos são atormentados pelo fumo e pelas trevas, e horrorizados pela vista dos outros condenados e dos demônios; os ouvidos ouvem dia e noite contínuos clamores, prantos e blasfêmias.O olfato é atormentado pelo cheiro nauseabundo daqueles inumeráveis corpos corrompidos, e o paladar por ardentíssima sede e fome insaciável sem poder obter uma gota de água nem uma migalha de pão.Por isso aqueles encarcerados infelizes, abrasados pela sede, devorados pelo fogo, torturados por toda a espécie de sofrimentos, choram, clamam, desesperam-se; mas não há nem haverá quem os alivie e console.Ó inferno, inferno!Quantos há que se recusam a crer em ti até o momento em que caem em teus abismos!E tu, querido leitor, que dizes?Se houvesses de morrer agora, para onde irias?Tu, que não podes suportar o ardor de uma centelha de fogo que te salta á mão, poderás estar em um abismo de fogo que te abrase, abandonado de todos por toda a eternidade e sem lenitivo algum?


2.Considera em seguida a pena que tocará ás potências da alma.A memória será sempre atormentada pelos remorsos da consciência.Tal é aquele verme que sem cessar roerá o condenado ao pensar que se perdeu voluntariamente e por um prazer envenenado.Ó Deus!Como avaliará então aqueles momentos de prazer, depois de cem, depois de mil milhões de anos no inferno?Este verme recordar-lhe-á o tempo que Deus lhe deu para expiar suas culpas, os meios que lhe proporcionou para salvar-se, os bons exemplos dos companheiros, os propósitos feitos mas ineficazes.Então verá que já não há remédio para a sua eterna ruína.Ó Deus!Ó Deus!E como estes pensamentos agravarão o seu penar!A vontade estará sempre contrariada: nunca alcançará coisa alguma do que deseja, e sempre terá o que aborrece, isto é, todos os tormentos.O entendimento conhecerá o bem enorme que perdeu: a bem-aventurança e Deus.Meu Deus!meu Deus! Perdoai-me pelo amor de Jesus Cristo, vosso Filho.

3.Pecador, a quem por agora é indiferente perder o céu e perder a Deus, quando vires os bem-aventurados triunfarem e gozarem no reino dos céus, então tu, qual animal hediondo, serás excluídos daquela pátria ditosa e privado da visão beatífica de Deus, da companhia de Maria Santíssima, dos Anjos e dos Santos; conhecerá, ai!Tua espantosa cegueira, e dirás desesperado:"Ó Paraíso de eternas delícias: Ó Deus! Ó bem infinito! Já não sois nem jamais sereis meus! Desgraçado de mim!..." Eia, meu irmão, faze penitência, muda de vida, não te guardes para quando o tempo te faltar.Entrega-te a Deus, principia a amá-lo deverás.

Roga a Jesus, roga a Maria Santíssima que tenham piedade de ti.

Fruto I.Descontarei com alguma mortificação as penas que no inferno tenho merecido.

Fruto II.Quando experimentar algum dissabor, incomodo ou dor, direi a mim mesmo: "Lembra-te que tens merecido cair, e devias ser precipitado no inferno", e tudo sofrerei com paciência.